Existem dois tipos principais de pesquisas na área da saúde: a básica, realizada dentro da academia, e a clínica, feita normalmente com apoio do setor privado, principalmente da indústria farmacêutica. O Brasil enfrenta obstáculos nas duas modalidades. No campo da pesquisa acadêmica, o problema está nos cortes de recursos, já para os ensaios clínicos, o gargalo consiste no excesso de burocracia. Considerando o envelhecimento da população brasileira e as estimativas de mais de 580 mil novos casos de câncer por ano no país, especialistas consideram a questão crucial para os avanços no tratamento desses pacientes.
“As pesquisas podem promover aprimoramento de terapias já existentes, garantindo mais qualidade de vida para pacientes ao reduzir reações adversas ou facilitar a adesão ao tratamento. Além disso, implicam em descobertas inovadoras, que podem significar a cura ou o controle de doenças graves, como o câncer”, aponta Dra. Andreia Melo, oncologista da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
Os últimos avanços mais inovadores na área da oncologia só foram possíveis devido a esses estudos. Porém, infelizmente, nosso país está na 24ª posição no ranking mundial de pesquisa clínica, com apenas 2,1% dos estudos do mundo, o que representa uma queda de sete posições nos últimos dez anos. Com o melhor aproveitamento de seu potencial, o Brasil poderia saltar para a 10ª colocação, atraindo um investimento estimado de R$ 2 bilhões, com efeitos na economia ainda maiores, em torno de R$5 bilhões.
Segundo Dra. Andreia, a maior dificuldade quando falamos de ensaios clínicos é a demora dos processos. “Comparado a outros países, o Brasil tem um tempo de aprovação muito longo, que leva em média um ano. Nos EUA, por exemplo, costuma demorar no máximo seis meses para um estudo ser aprovado. Isso prejudica muito a inclusão de pacientes brasileiros em grandes ensaios clínicos internacionais”.
Apesar das adversidades, o Brasil tem diversas vantagens que podem beneficiar a realização de estudos clínicos, como sua relevância demográfica e econômica, a diversidade étnica e o custo competitivo comparado a outros países. “Temos potencial para ser um país protagonista nessa área. Economicamente é muito interessante realizar estudos aqui, pois é muito mais barato do que na maioria dos países, além de termos uma população heterogênea, com enorme gama de genótipos, um fator crítico para alguns tipos específicos de estudos e de alta relevância para a pesquisa clínica”, defende a Dra. Andreia.
No âmbito acadêmico, as preocupações são especialmente relacionadas a falta de recursos, pois este ano anunciaram diversos cortes em bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Dra. Andreia lamenta que essas limitações financeiras fazem com que o Brasil perca as melhores mentes para outros países do mundo, pois os pesquisadores que têm a oportunidade, acabam indo estudar fora do país.
Quando a pesquisa básica em oncologia é afetada, fica muito mais difícil que um novo biomarcador seja descoberto no país, por exemplo, o que nos colocaria em uma importante posição científica internacionalmente. Ao promover melhorias na área das pesquisas, também há o benefício de gerar empregos altamente qualificados, conhecimento, investimentos em infraestrutura e ambientes favoráveis à formação de cientistas.
A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica defende a valorização das pesquisas para garantir ou devolver a qualidade de vida aos pacientes. Nosso país tem muito potencial na área e, com algumas melhorias, como mais agilidade na aprovação dos pedidos de estudos clínicos, que nos aproximem dos padrões dos países desenvolvidos, é possível elevar a nossa posição no ranking mundial, posicionando o Brasil como um importante difusor de conhecimento científico.