Você já se perguntou por onde andam seus dados hoje? Costumamos nos inscrever e nos registrar em tantos serviços on-line que não é surpresa nenhuma a perda completa de noção quanto a essa questão. Porém, mais do que nunca, precisamos conversar sobre a importância de alguns cuidados com nossos dados e informações na internet, uma vez que nunca estivemos tão expostos como nos dias de hoje.
Preliminarmente, de onde veio essa sede tão grande por nossas informações, a ponto de empresas como o Facebook, em seus termos de uso, estabelecerem recursos para monitorar a nossa navegação até mesmo quando estamos conectados na rede social? Para entender esse fenômeno, precisamos voltar alguns anos, em 2007, auge da revolução da internet móvel e da chamada web 2.0, com blogs, fotologs, sites pessoais e redes sociais. Foi esse ano que um jornalista do The New York Times, de nome John Markoff, alertou que chegaria o dia em que as empresas de tecnologia enxergariam nos nossos dados um potencial econômico enorme, e que quando isso acontecesse, testemunharíamos uma nova revolução na internet mundial.
Ele não estava errado. A ideia do uso econômico dos nossos dados por empresas de tecnologia fomentou o que hoje chamamos de web 3.0, ou internet semântica. Convivemos hoje com algoritmos e inteligência artificial de toda sorte: big data, machine learning, blockchain, expressões que parecem saídas de obras de ficção científica, mas que estão mais presentes em nossas vidas do que imaginamos.
Onde nossos dados entram nisso? Bem, eles são o petróleo da era da internet; são o combustível que move essa economia digital, alimentando sistemas de inteligência artificial, com a finalidade de promover para cada usuário uma experiência individual ao navegar na internet. Recomendações de vídeos no YouTube, descobertas musicais no Spotify, sugestões da Netflix, propagandas direcionadas pelo Facebook e pelo Google, tudo isso é alimentado por nossos dados estruturados e não-estruturados.
Até que ponto, porém, podemos dizer que ainda existe alguma forma de privacidade na internet? Sempre usamos a internet sem grandes preocupações: não existe no Brasil uma cultura amadurecida de segurança digital, muitos não se preocupam com senhas fortes, ou em checar os sites onde cadastram suas informações, ou ainda com recursos básicos de segurança, como uma autenticação em dois fatores. Todos esses dados, uma vez tratados, se tornam informação ao nosso respeito – e como bem dizia Einstein, não existe informação que não seja poder. É aqui que repousa o risco do mau uso dos nossos dados e informações.
Nos últimos anos, as fraudes eletrônicas aumentaram exponencialmente. Durante a pandemia, um levantamento realizado pela Konduto estima que a cada 100 compras on-line, quatro foram alvos de algum tipo de fraude; só no Distrito Federal o aumento do número de golpes foi de 310%, segundo a Polícia Civil. Estamos falando de clonagem de cartão, golpes no comércio, phishing, e outras condutas várias das quais ficaríamos aqui horas discorrendo.
Temos instrumentos legais para nos proteger. O Marco Civil da Internet, Lei n. 12.965/14, já trazia em seu corpo disposições relacionadas à proteção de dados. Mais tarde, a Lei Geral de Proteção de Dados, Lei n. 13.708/18, fortemente inspirada no regulamento da União Europeia, a RGPD, entrou em vigor em setembro de 2020 para trazer ainda mais instrumentos de proteção aos nossos dados e à nossa privacidade. Mas como garantir a eficácia das ferramentas contra um algoz sem rosto?
As autoridades ainda têm um longo caminho na aplicação das normas sobre aqueles que usam indevidamente os nossos dados – um novo paradigma terá de ser construído nos próximos anos, com empresas usando de forma mais responsável as nossas informações. Até lá, cabe a nós, usuários, o elo mais fraco dessa corrente, buscarmos nos proteger, tomando cuidado com relação aos dados e informações que compartilhamos, adotando ferramentas de segurança como senha mais seguras e autenticação em dois fatores sempre que possível, e, principalmente, evitando sites maliciosos, links suspeitos e ofertas boas demais para serem verdade. Desconfiar de tudo é um bom começo para uma rotina mais segura na internet.
*Raphael Chaia, professor de Direito da Universidade Católica Dom Bosco