O Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, por meio do Laboratório Conexões do Clima, realizou em março de 2022 a pesquisa “Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Econômico: percepções da população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro”. O levando, realizado em maio, fez um diagnóstico sobre como as classes B e C percebem os efeitos do aquecimento global em seu dia a dia. Um dos temas que mais geram preocupação é o de chuvas intensas, inundações, deslizamentos e segurança hídrica. Queimadas na Amazônia e no Pantanal também foram lembradas, mas como problemas mais distantes.
As cenas dos recentes desabamentos de encostas em Petrópolis, na Região Serrana, ou a vivência de dramas pessoais, com o enfrentamento de alagamentos de ruas e casas em períodos de chuvas, tanto na baixada fluminense como em diferentes regiões do estado, ajudam a acentuar a ideia de que existe um risco cada vez maior para todos.
“Há uma visão de que algo grave está acontecendo, com mais desastres, chuvas mais fortes e mais frequentes, e estações do ano mais indefinidas. Apesar de não haver dentro desse grupo pesquisado uma formulação mais precisa sobre o tema, há uma percepção instintiva de que vivemos uma crise ambiental grave e que as consequências podem ser devastadoras”, explica a coordenadora do Fórum de Ciência e Cultura, Tatiana Roque.
A pesquisa, realizada de forma qualitativa, reuniu oito grupos focais, cada um com 8 a 10 pessoas. A partir daí, foram estabelecidas dinâmicas com debates de até duas horas de duração com cada grupo.
“Ouvimos pessoas com idades entre 18 e 50 anos das classes B e C. A pesquisa joga luz sobre um tema que muitas vezes parece não estar associado à realidade e às preocupações desse grupo. Mas concluímos que as pessoas se preocupam sim, só não sabem como resolver”, salienta Tatiana Roque.
Um ponto de destaque do levantamento é a de que há hoje uma grande preocupação com a infraestrutura habitacional e com a melhoria da rede de saneamento. Lixo e esgoto são problemas levantados com frequência e espontaneamente. Os seguidos casos de geosmina na água também foram lembrados. Muitos lembram da Baía de Guanabara como um caso que evidencia a má educação do povo que joga lixo e polui, por um lado; e a ineficiência das políticas públicas, por outro, “Despoluição da baía de Guanabara há mais de 20 anos…é um case de fracasso”; “Baía de Guanabara é um lixo, quando eu era criança eu entrava. Hoje, sai com um braço a mais”.
“Há um entendimento de que esses problemas são reflexos da falta de cuidado com a limpeza urbana e de uma política voltada a cuidar dos resíduos em geral, que são vistos como os principais motivos para a ocorrência de deslizamentos e alagamentos. Mas há pouca esperança de que o poder público resolva o problema e as soluções elencadas são individuais na maioria das vezes” destaca Tatiana.
A baixa fiscalização do Estado foi apontada, bem como a ausência de política habitacional. O consumo individual é superdimensionado como capaz de ajudar a resolver questões ambientais. A dimensão da desigualdade socioeconômica é forte: ainda que haja percepção de que a chuva atinge a todos, as condições para cada família proteger a si e a seus bens é desigual. Além disso, há entendimento de que famílias ricas podem restituir-se de seus bens, enquanto os pobres ficarão desprovidos de tudo.
De modo geral, o debate climático encontra ambiente bastante receptivo entre o público pesquisado: não foram mobilizados argumentos negacionistas na amostra pesquisada. Isso está em sintonia com pesquisas quantitativas já realizadas sobre o tema. O objetivo desta pesquisa qualitativa foi relacionar esse tema com questões econômicas. Notamos um descompasso entre a percepção da complexidade e da abrangência dos problemas e a aposta em soluções micro-individualizadas. Notamos uma responsabilização mediana do Estado e das empresas, mas baixa expectativa de que esses atores solucionem o problema. As principais “saídas” apontadas são individuais, sem pensar em mudanças estruturais do modelo de desenvolvimento econômico: manejo de resíduos, consumo consciente e empresas sustentáveis; mas também infraestrutura habitacional e infraestrutura de saneamento.
“Concluímos que é preciso territorializar o debate climático e ambiental, aterrissar as questões, torná-las mais palpáveis e relacionadas com os problemas quotidianos e com o modelo econômico, que não é visto como relacionado às questões ambientais e climática. Essas ainda têm algo de etéreo e abstrato diante de urgências cotidianas”, diz Tatiana.