Antecipar desafios é uma prática comum entre os brasileiros, uma característica profundamente enraizada na cultura nacional. No universo empresarial, essa mentalidade cautelosa atinge seu ponto alto, especialmente quando se trata de investimentos em meio a possíveis turbulências econômicas e financeiras. No entanto, é crucial questionar até que ponto essa prevenção prévia pode ser vantajosa e de que forma ela reverbera na vida dos trabalhadores.
As razões para isso são diversas. Internamente há a taxa de juros em 12,25%, projeção do Produto Interno Bruto (PIB) em constante oscilação para os próximos anos, previsão de perda de 1 milhão de empregos com o veto presidencial da desoneração da folha de pagamento, inflação que pode chegar a 4% em 2024, crise no varejo entre novas políticas de taxação envolvendo a tão esperada Reforma Tributária.
No cenário internacional, os receios de investimento tomados por qualquer empreendedor também podem ser barrados pelo contexto social, político e econômico externo. No Oriente Médio, por exemplo, os desdobramentos da guerra entre Israel e o grupo Hamas, no continente europeu, os conflitos entre Rússia e Ucrânia, sem contar as crises nos países vizinhos ao Brasil – Venezuela e Argentina -, os colapsos nos bancos norte-americanos além de outros noticiários que trazem a sensação de que não há estabilidade mundial para decisões de sucesso.
O especialista em carreira, gestão empresarial e sócio-diretor da consultoria BR Talent, Rudney Pereira Junior, explica o termo crise fantasma e como há impacto na retenção e aquisição de talentos nos negócios brasileiros. “Existe um ar de insegurança que paira sobre os níveis de gestão das companhias. Ou seja, as tomadas de decisões estão mais lentas, conservadoras e as companhias não estão investindo o suficiente em recursos humanos. Em outras palavras, não há contratação de pessoas em número expressivo, os programas de desenvolvimento de pessoas passam a ser colocado em espera ou são feitos de maneira ineficiente, demais ações de incentivos, como os de graduação ou pós-graduação perdem orçamento, impactando na vida profissional do trabalhados dentro das companhias e, automaticamente, a empresa passa a ter uma equipe menor do que o necessário – com menos qualificação”, conta.
Uma curiosidade na análise do especialista, é o cenário “positivo” em contratações e queda de desemprego que o país enfrenta contrariando o pessimismo encubado esperado por muitos. Por exemplo, segundo o Caged, o Brasil abriu 190 mil vagas de empregos formais no mês de outubro, sendo um aumento de 18,8% quando comparado a agosto. Já a taxa de desemprego trimestral, chamou atenção para alguns estados brasileiros, porque teve uma queda histórica, desde 2015, sendo 7,7% – como mostram os dados do IBGE.
Se estamos caminhando internamente bem, ao menos no recorte de empregabilidade, como mostram os números, por que há receios de lideranças e CEOs, com extremas precauções, e falta de confiança para adotar projetos e investimentos financeiros? Seriam essas as definições para uma crise fantasma que apenas amedronta investidores, empreendedores e empresários?
“Os indicadores de desemprego estão caindo e estamos falando de crise fantasma, parece estranho, contradizer um dado positivo, mas é uma falsa sensação de que está tudo bem, se formos a fundo; fará sentido e dá para compreender o receio de um investidor. Se analisarmos bem, há menos posições e com salários menores em cargo de gestão, sem contar a diminuição dos trabalhos formais se comparados aos informais. Se contrata, na formalidade, mas se reduz o nível do cargo. Há acumulo de funções e, automaticamente, na forma de se fazer gestão, de treinar e desenvolver – sem contar o medo de se investir mais T&D de cada colaborador, nas melhorias em infraestrutura, crescimento e manutenção dos programas in company, assessorias de saúde mental entre outros benefícios básicos para uma gestão de recursos humanos e de outras áreas como um todo”, alerta Junior.
Quando o assunto é investimento dos trabalhadores e como essa “crise fantasma” pode atrapalhar nisso e em outras ações para diversos setores; vale analisar alguns dados sobre T&D, disponibilizados pela 17ª edição do “Panorama de Treinamento no Brasil – 2023”, feito pela Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento (ABTD). Por exemplo, em seus gastos, as empresas dedicam 2,31% em treinamento e desenvolvimento, anualmente, sobre a folha de pagamento. Sendo uma média de R$ 1.012 por colaborador.
Soluções
O especialista explica que durante essa crise fantasma que assombra internamente na tomada de decisões, para se investir, é indispensável pensar em estratégias econômicas e criativas para não deixar de executar o que se precisa. “Um empresário não se livrará tão cedo dos pessimismos que podemos esperar nos próximos anos, internamente ele é conservador para acreditar na melhoria interna e tem receio do contexto mundial em chamas. Sendo assim, é preciso rever planos e projetos, de maneira inovadora e moderada para ampliar caminhos, atender melhorias e necessidades de gestão empresarial como um todo. Usar menos recursos não impede de contratar pessoas e dar prosseguimento dos projetos de desenvolvimento. Deixar um vazio, por não realizar algo, não é a solução mais acertada e isso só complicará ainda mais os ânimos”, finaliza Rudney Pereira Junior.