Campo Grande (MS) – Se um único girassol é capaz de atrair olhares e despertar sorrisos pela exuberância de sua cor. Imagine então centenas ou milhares deles reunidos em um único terreno formando uma grande lavoura, ou, por assim dizer, um buquê gigante. É assim em Chapadão do Sul, onde todos os anos as flores dão um colorido especial na fazenda “Gávia”, alegrando o ambiente, gerando renda ao seu proprietário e servindo de fonte de renda, inclusive, para a agricultura familiar através da apicultura migratória.
É que em 500 hectares de cultivo, os girassóis dividem espaço com outro ser vivo de pigmentação amarelada: as abelhas da espécie Apis Mellífera, popularmente, conhecida como “abelha-europeia” ou “abelha-europa”. Uma forma inteligente de garantir a polinização das flores e driblar a entressafra do mel ao mesmo tempo. “Já faz anos que a gente tira mel do girassol. Diferente da florada silvestre [período da primavera], o mel de girassol é quase transparente, de um amarelado muito bonito e o sabor é tão bom quanto o outro mais escuro”, afirma a apicultora Rosângela Vargas.
Além da garantia do sabor do produto, a outra vantagem é a contínua produção do mel e seus derivados. “Antes a gente esperava a florada tradicional, silvestre, que começa em meados de setembro e vai até dezembro ou janeiro. Agora, praticamente é mel o ano inteiro, depois que passamos a levar as colmeias para as lavouras não há essa espera”, afirma.
Outro ganho garantido é ao grande produtor que decide abrir as porteiras para a apicultura. “O senhor Ronan Zocal e a sua família sempre gostaram de mexer com girassol. Há mais de 10 anos que eles trabalham com isso e, faz um tempo que a gente sabe que as abelhas ajudam na polinização das flores estimulando a florada”, diz o gerente da fazenda, Carlos Alberto Almeida.
Na fazenda, uma pequena parte das sementes de girassol é destinada a produção de óleo. A maior parcela é separada mesmo para o trato de passarinhos, ou seja, preparo de ração. Uma lavoura que de uma forma ou de outra alimenta os seres vivos e retribui os cuidados com um doce sabor. “A cada caixa que deixamos na lavoura a gente repassa um quilo de mel para o proprietário. Acredito que todo mundo sai ganhando. A gente tem mel o ano inteiro e o grande produtor também ganha”, observa a apicultora.
Mel o ano inteiro
O principal objetivo da apicultura migratória é exatamente esse de garantir que o apicultor não precise buscar outras formas de produção e possa se dedicar mais e melhor para a apicultura. “A apicultura migratória requer alguns cuidados de manejo, mas é vantajosa para os apicultores e os lavoureiros. É um trabalho que observa o ciclo das floradas: primeiro vem o eucalipto, em algumas áreas, depois o girassol, o nabo forrageiro logo em seguida, posteriormente o cipó-uva e a florada silvestre, época costumeira da primavera”, detalha o coordenador municipal da Agraer de Chapadão do Sul, Reinaldo dos Santos, mais conhecido entre os colegas de trabalho e agricultores familiares como “Braquiara”.
Rosângela segue o ofício do seu pai, Olavo Vargas, que há dois meses faleceu deixando as lembranças, o conhecimento e amor pela natureza como heranças. “Estou tomando conta. Eu sempre trabalhei com ele. Sem contar que além do mel as abelhas fazem um importante trabalho de polinização”, lembra.Para aproveitar todo o potencial dos girassóis, foram colocadas 60 caixas na lavoura só da parte da apicultora Rosângela. “Lá, estou com meus enxames porque não tem mais florada de eucalipto e, em breve, começa o nabo forrageiro na fazenda. Lá, o girassol começou em abril e vai até meados de junho. Tem uns secando, outros florescendo e flores maduras. O plantio começou um pouco mais tarde. Já o nabo deve ficar de maio e agosto”, calcula.
E a apicultora está com a razão. Conforme dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura – FAO/2014, estima-se que aproximadamente 73% das espécies vegetais cultivadas no mundo sejam polinizadas por alguma espécie de abelha, moscas (19%), morcegos (6,5%), vespas e besouros (5%), pássaros (4%), e as borboletas e mariposas (4%).
Em Chapadão do Sul, Camapuã e Campo Grande, por exemplo, o sistema integrado abelha, agricultura e mata nativa gera, em pólen, cerca de 5 toneladas ano. Já, na Silvicultura, em termos de parceria entre empresas de celulose e associações (Cassilândia, Chapadão do Sul, Amambai, Três Lagoas e Brasilândia) são utilizados aproximadamente 100 mil hectares com 14.670 colmeias, com base em um levantamento, no ano de 2014, feito pela Federação de Apicultura e Meliponicultura do Mato Grosso do Sul (Feams).
Mercado promissor
Com suas diferentes práticas, a apicultura tem gerado alternativas de produção e ganhos significativos para o Brasil dentro do mercado de exportação. Tal prática aliada ao setor tradicional de criação de abelhas fez com que o País saltasse no ranking da 15ª para a 8ª posição, isso em menos de dez anos, segundo dados da área de inteligência comercial da Abemel (a Associação Brasileira de Exportadores de Mel). Em se tratando de quantidade foram produzidas 37,82 mil toneladas em 2015.
Segundo a última pesquisa divulgada pelo IBGE, o valor da produção total de mel, em 2015, foi de R$ 358,85 milhões, indicando aumento de 13,9% em relação a 2014. O preço médio nacional foi de R$ 9,49 o quilo do produto. A média de preço mais alta foi registrada no Norte (R$ 15,64), enquanto a menor, no Nordeste (R$ 8,34).
E a boa notícia não se restringe a comercialização visto que o Brasil possui um cenário propício para a cultura do mel com grandes áreas de matas nativas associadas às boas práticas de consorciamento (integração agricultura e apicultura). “Havendo a presença das abelhas nas áreas de cultivo deve se ter esse cuidado para a não aplicação de defensivos agrícolas nas lavouras”, diz o coordenador da Agraer Reinaldo.
Detalhes no manejo das colmeias que fazem a diferença na qualidade do produto final (polén, geleia real, própolis e mel). Se comparado com a China, país considerado o maior produtor mundial de mel, o Brasil possui grandes vantagens e atrai a atenção do mercado norte-americano e europeu que buscam cada vez mais por um mel de excelência, sem a presença de antibióticos ou componentes químicos, agrotóxicos ou metais pesados.
É que devido ao alto nível de poluição do meio ambiente é comum em alguns países asiáticos o uso de antibióticos no combate de doenças ou fortalecimento das abelhas. Tais práticas têm colocado muitos países em estado de alerta quanto à qualidade do mel, com exigências mais rigorosas quanto à procedência do produto. Fatores estes que influenciaram o apreço do mel brasileiro no mercado estrangeiro, uma vez que o sistema de apicultura daqui se utiliza de um modelo produtivo sustentável e livre de agrotóxicos.
De acordo com dados da Agraer, os principais importadores de mel brasileiro são a Alemanha, Estados Unidos, Japão, França e Reino Unido. As compras internacionais estão ao redor de 300 mil ton/ano. Tanta procura incentiva os apicultores a irem atrás do associativismo como forma de fortalecer a produção e atender o mercado consumidor.
Mel do cerrado
Atualmente, o Mato Grosso do Sul ocupa a 10ª posição na produção de mel no Brasil, com uma produção calculada em torno de 830 toneladas/ano. O cenário estadual comporta 715 apicultores, sendo 500 cadastrados na Iagro – Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal Governo do Estado de Mato Grosso do Sul.
Os três primeiros lugares no ranking nacional ficam, respectivamente, para o Paraná (6,29 mil toneladas/ano), Rio Grande do Sul (4,96 mil toneladas/ano) e Bahia (4,60 mil toneladas/ano).
Calcula-se que haja em torno de 21 mil colmeias em todo o nosso estado e 42 associações. Agregue a estes números, também, os 19 entrepostos, pontos importantes de armazenagem e cuidados do mel para que esteja apto ao consumo humano. Ao todo, são 10 entrepostos municipais, 7 unidades estaduais e 2 de serviço de Inspeção Federal (SIF).
O trabalho que envolve diferentes instituições para desenvolver a certificação “Mel do Pantanal”, conhecida tecnicamente como IG (Identificação Geográfica) é outro chamariz para alcançar o mercado internacional e aprimorar as tecnologias adotadas pela apicultura do Mato Grosso do Sul.Para alavancar a produção local, a Agraer vem ao longo dos anos investindo no eixo da apicultura através de cursos, acompanhamentos nos apiários, elaboração de projetos e repasse de equipamentos via governo do Estado. Tanto que, no ano de 2015, foram repassados R$ 350 mil para aquisição de equipamentos (centrífuga, mesa desoperculadora, máquina de sachê) e custos com treinamento para a formação de um entreposto em Aquidauana. O local presta serviços para outras 9 cidades: Anastácio, Guia Lopes, Jardim, Maracaju, Nioaque, Miranda, Corumbá, Coxim e Nova Andradina.
Apesar dos desafios e oscilações de preço, todo o cenário já descrito acima somado a crescente prática da apicultura migratória, nos faz acreditar que o futuro é promissor para a apicultura brasileira.
A apicultura móvel ou migratória atende as necessidades de polinização dos pomares e culturas para a produção de sementes e frutas. O Brasil, por ser um dos principais produtores de alimentos do mundo, não pode desconsiderar a participação das abelhas para garantir a produção de uma extensa cartela de alimentos.
A representatividade das abelhas está tão interligada a produção agrícola que os profissionais ou curiosos no assunto podem visitar a página da campanha “Sem Abelha Sem Alimentos” também conhecida como “Bee Or Not To Be”, uma referência à conhecida frase do poeta inglês Shakespeare. Lá, é possível conferir um pouco da grande importância da preservação desse pequenino inseto seja para o meio ambiente como para o nosso deleite nas prateleiras dos mercados, farmácias e feiras livres que comercializam o mel e seus derivados.
Fonte: Assessoria de Comunicação da Agraer