São Paulo (SP) – Instituído pela 30ª Conferência Geral da UNESCO, em 1999, com o intuito de impulsionar as criações poéticas e promover a diversidade linguística, o Dia Mundial da Poesia é comemorado nesta quarta-feira, dia 21 de março. A poesia é um tipo de texto literário muito presente no vestibular e tem uma linguagem diferente dos textos em prosa, o que causa uma certa preocupação nos alunos.
Para tornar a vida do vestibulando mais fácil neste aspecto, o Stoodi – cursinho online à distância -, separou cinco poemas que todo o vestibulando precisa conhecer. Geralmente, estes poemas são cobrados nas provas de Literatura de cada vestibular, mas também existe a possibilidade de fazerem parte dos textos motivadores das propostas de redação.
A professora Marina Sestito, coordenadora de Redação do Stoodi, explica que o uso dos poemas, no Enem e nos vestibulares, ocorre geralmente para retratar um problema social que será discutido pelo aluno na redação. “É importante fazer uma interpretação cuidadosa dos poemas para apreender a situação retratada pelo texto”, explica.
De uma forma geral, seja no texto de apoio da redação ou nas questões de Literatura, a dica para ter um bom desempenho em questões envolvendo poesia é o aluno dominar as fases literárias e entender quem participa de cada movimento, dando foco sempre no autor. Confira cinco exemplos de poemas que podem cair no vestibular, acompanhadas de dicas de estudo e, ao final do texto, os poemas, na íntegra.
1) José – Carlos Drummond de Andrade
Graças ao poema de Drummond de Andrade – um dos mais famosos da literatura brasileira – surgiu a famosa gíria “e agora, José?”, utilizada ainda hoje para expressar a indecisão perante as situações difíceis. Publicado pela primeira vez na coletânea Poesias, em 1942, o poema expressa a solidão e o abandono do indivíduo.
Para entender o contexto histórico do poema, é preciso lembrar-se que o mundo atravessava a Segunda Grande Guerra, e o Brasil acabara de entrar no Estado Novo, de Getúlio Vargas. Ambos acontecimentos históricos suscitavam nas pessoas um clima de medo e de repressão.
Drummond é um dos nomes mais importantes da Literatura brasileira e seus poemas relatam assuntos do cotidiano, sempre utilizando a ironia e seu pessimismo característico. Os principais temas retratados em suas obras são: conflitos sociais, lembranças do local de sua origem e visão crítica tanto do mundo, quanto dos homens.
2) Soneto da Fidelidade – Vinicius de Moraes
Vinicius de Moraes, assim como Cecília Meireles, Jorge de Lima e Murilo Mendes, pertence à segunda geração modernista da poesia brasileira. Por isso, são considerados poetas espiritualistas.
Segundo a coordenadora de Redação do Stoodi, Marina Sestito, um passo muito importante na hora de analisar os poemas é prestar atenção nas figuras de linguagem. “Será justamente aí que você encontrará algumas informações implícitas no texto. Preste atenção nas metáforas, nas antíteses ou em qualquer outra figura de linguagem que estiver presente”, comenta.
No Soneto da Fidelidade, por exemplo, há dois exemplos: no trecho “posto que é chama”, o poeta utiliza uma metáfora para se referir ao amor. Já quando deseja que seja “infinito enquanto dure”, a figura de linguagem utilizada é o paradoxo, caracterizada por uma associação de conceitos contraditórios para representar uma ideia.
3) Canção do Exílio – Gonçalves Dias
Dona de um dos versos mais conhecidos da poesia nacional, “Minha terra tem palmeiras, onde canta o Sabiá”, foi escrito pelo poeta maranhense Gonçalves Dias, em 1843, e publicado treze anos depois, no livro “Primeiros Cantos”. O poema, que integra a primeira fase do Romantismo, é tão emblemático que até teve um verso sendo utilizado no Hino Nacional: “Nossos bosques têm mais vida,/ Nossa vida, mais amores”.
A dica da professora do Stoodi, neste caso, é de não deixar sua opinião afetar sua interpretação do texto. “Justamente por se tratar de um texto com muita subjetividade, não deixe a sua opinião e concepção sobre determinado tema interferir na interpretação da poesia. Leia sempre de modo neutro em relação ao ponto de vista do poeta, sem carregar preconceito sobre o assunto abordado”, diz.
Este julgamento por parte dos alunos tende a ocorrer justamente com os autores mais antigos, cujos termos e linguagem sejam distantes da nossa, como é o caso de Gonçalves Dias, afinal, não falamos no dia a dia que as aves gorjeiam, não é?
4) Versos íntimos – Augusto dos Anjos
Versos Íntimos é um poema escrito por Augusto dos Anjos, que expressa um sentimento de pessimismo e decepção em relação aos relacionamentos interpessoais. Este soneto retrata a visão niilista que o poeta tinha dos relacionamentos e da vida de uma maneira geral. A ideia geral do poema, extremamente pessimista, é considerada uma ruptura com suas tendências literárias parnasianistas, que apresentavam a vida sob uma visão romântica.
A dica do Stoodi neste poema é: conheça brevemente a vida dos principais autores. Augusto dos Anjos, por exemplo, nasceu no Engenho Pau d’Arco, onde fica atualmente o município de Sapé, na Paraíba, e começou a escrever poesias já aos sete anos de idade. Sua obra é dividida em três fases principais: a primeira (da qual pertence Versos Íntimos), é muito influenciada pelo simbolismo. A segunda fase é mais focada na visão de mundo (nada tradicional) do autor e, a terceira, é caracterizada por obras mais maduras, como por exemplo, o poema Ao Luar.
5) Vou-me embora pra Pasárgada – Manuel Bandeira
Também modernista, este é o poema mais conhecido de Manuel Bandeira, que deixa nítido nesses versos sua vontade de fugir da sua realidade e encontrar um lugar paradisíaco, onde tudo aconteça da forma que ele deseja. É importante que o vestibulando consiga relacionar o poema à tuberculose que acometia seu autor. Ele deseja usufruir de satisfação carnal, riqueza e felicidade, mas a doença o impede de ter qualquer prazer neste sentido.
O poema foi publicado no livro Libertinagem, de 1930 e tem no escapismo, a fuga da realidade, como sua principal característica. Vale ficar atento também às referências elogiosas às máquinas e à tecnologia, como nos versos: “Tem telefone automático/ Tem alcalóide à vontade”.
Confira os cinco (5) poemas citados, na íntegra:
1) José – Carlos Drummond de Andrade
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
2) Soneto de fidelidade – Vinícius de Morais
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quanto mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama.
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Vinicius de Moraes, ao lado de nomes como Cecília Meireles, Jorge de Lima e Murilo fazem parte da segunda geração modernista da poesia brasileira.
3) Canção do Exílio – Gonçalves Dias
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
4.1) Versos íntimos – Augusto dos Anjos
Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te a lama que te espera!
O Homem que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro.
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa ainda pena a tua chaga
Apedreja essa mão vil que te afaga.
Escarra nessa boca de que beija!
4.2) Ao Luar – Augusto dos Anjos – (Bonus track)
Quando, à noite, o Infinito se levanta
À luz do luar, pelos caminhos quedos
Minha tátil intensidade é tanta
Que eu sinto a alma do Cosmos nos meus dedos!
Quebro a custódia dos sentidos tredos
E a minha mão, dona, por fim, de quanta
Grandeza o Orbe estrangula em seus segredos,
Todas as coisas íntimas suplanta!
Penetro, agarro, ausculto, apreendo, invado
Nos paroxismos da hiperestesia,
O Infinitésimo e o Indeterminado…
Transponho ousadamente o átomo rude
E, transmudado em rutilância fria,
Encho o Espaço com a minha plenitude!
5) Vou-me embora pra Pasárgada – Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.