Campo Grande (MS) – Aproximar a comunidade do museu é o que propôs a coordenadora de Promoção e Gestão da Imagem Institucional do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus) Ana Lourdes de Aguiar Costa, durante a palestra “Hiperconecção e museus: desafios de experiências significativas no contexto físico e digital” que aconteceu na sexta-feira (18.05) na Câmara Municipal de Maracajú, encerrando as atividades da Semana Nacional de Museus em Mato Grosso do Sul. Participaram professores, acadêmicos, museólogos e comunidade.
Segundo a representante do Ibram, ao longo desses 16 anos, foram realizados durante a Semana Nacional de Museu, mais de 38.500 eventos, sendo a maior participação quando 1378 museus aderiram à Semana. Todas as regiões do Brasil participam do evento, em que 18 de maio é o Dia Internacional do Museu. Na última quarta-feira (16.05) a senadora sergipana Maria do Carmo propôs o Dia Nacional do Museu que está em tramitação.
“A gente pensa tudo ao mesmo tempo agora”. Ana Lourdes Aguiar, representante do Ibram. Foto: André Messias
Durante sua explanação, Ana Lourdes Aguiar Costa disse que ao pensar em hiperconexão, “a gente pensa tudo ao mesmo tempo agora”. Ao revelar sua idade, 44 anos, disse ter nascido no meio analógico e passou pela transição para o digital. “Essa geração de agora já nasce hiperconectada de todas as formas”, constatou.
Costa afirmou que a tecnologia nos trouxe a oportunidade de estar conectado o tempo todo. Mas hiperconexão não é só estar conectado digitalmente de todas as formas, mas uma questão de rede e de pessoas. “A gente já hiperconecta há muito tempo, quando os portugueses chegaram aqui no Brasil em que ocorreram as grandes navegações, já havia a hiperconexão com diferentes pessoas, culturas. Essa foi a proposta da Semana. Mas não é uma realidade de todo mundo estar conectado”, afirmou.
Trator a vapor de 1918 que está no Museu de Tratores – Ascomar em Maracajú. Foto: André Messias
A representante do Ibram, também fez um questionamento, “Como a gente pode hiperconectar com nossos museus?” Ela disse haver pesquisado sobre a cidade de Maracajú e constatou que há uma rota turística de museus, sendo eles o Museu de Tecnologia Regional Anna Thereza de Lima Alves, Museu de Tratores – Ascomar, Museu da Cachaça, Museu da Linguiça de Maracajú, Aptralmar. Para Costa, esse é um exemplo de hiperconexão, junta o turismo com os museus, o saber e a memória para oferecer um produto turístico na cidade.
Costa também citou alguns exemplos de museus que nasceram do anseio da comunidade como em Belo Horizonte (MG), onde existe o Museu de Favelas Urbanas, que resultou de um território quilombola e está numa favela. Na época esse quilombo ficava era uma área rural, mas a cidade avançou e virou uma área urbana e há quarenta anos, nove mulheres se reuniam na capela católica para rezar um terço, e falar de suas memórias, dos seus antepassados e uma mulher que se formou em História registrava a história delas de forma oral, até que chegou uma ordem de despejo naquela comunidade, que coincidiu com a chegada do Padre Mauro, um progressista, que fez campanhas publicitárias junto com uma agência para se montar um museu. Essa experiência fez com que as pessoas falassem por elas e estas fossem representadas em um museu.
A representante do Ibram continuou dizendo que não se tem acesso à arte negra no Brasil. A grande maioria dos museus representa à arte branca e muito masculina. “A arte é um continente, com diferentes culturas, dialetos, onde se há diferentes línguas, costumes. A grande maioria dos museus só representa gente branca e até certo tempo atrás, mulheres não pintavam, nem faziam esculturas, quem fazia eram os homens” frisou Costa, que ainda revelou que 90% dos brasileiros não vão a museus, esse índice aumenta quando se trata de favela.
Outra exposição citada por Costa foi o “Quarto de Doméstica”, que foi feito por mulheres que fazem uso desse oficio. Por meio da arte elas denunciam sua forma de trabalho, que por ironia cuida dos filhos dos outros, mas que não tem ninguém para cuidar dos filhos delas. “Isso é uma herança de um país escravocata, em que ainda hoje há essa escravidão velada, você diz que sua empregada doméstica é da família, mas você não a trata como tal”, disse.
Costa ainda comentou que sentiu falta da representação quilombola e indígena nos museus da cidade de Maracajú. “É necessário que os museus tenham representatividade, já que nestes deve haver o diálogo, ser inclusivo, participativo”. Ela citou o Museu de Culturas Indígenas Dom Bosco, em que já há uma boa relação com os indígenas e há toda uma proposta e respeito pela simbologia desses povos.
“É preciso que os museus sejam um espaço dialógico em que o pensamento crítico seja praticado. E os museus precisam ter uma relação muito próxima do outro, do público, da cidade. Museus são deixados de lado pelas administrações públicas, mas quando você tem uma comunidade forte, museu não fecha. E museu não é lugar de coisa velha, mas de pesquisa, de conhecimento, de lazer e de contemplação. A gente precisa como cidadãos colocar os museus em nossas vidas”, ressaltou Costa.
O acadêmico de pedagogia Willian Rafael Almeida, 20, é morador de Sidrolândia e questionou a representante do Ibram sobre como levar um museu para a sua cidade já que nela não tem. Para Ana, há algumas saídas como procurar a associação de moradores do município, ou formar um grupo de jovens, para que havendo mobilização sensibilize a administração pública para que o museu seja criado.
Já o coordenador do Sistema Estadual de Museus de MS, Douglas Alves Silva, disse que o departamento está fazendo um mapeamento de todas as cidades que têm e aquelas que não têm museus. Ainda segundo Silva, no estado há 64 museus cadastrados no sistema, e que Bataguassu e Costa Rica devem inaugurar museu anda esse ano. Também informou o e-mail da unidade museus@fcms.ms.gov.br para que os interessados possam entrar em contato.
A diretora presidente da Fundação de Cultura de Maracaju Eni Aquino, disse ter sido um privilégio o município ser escolhido para o encerramento da Semana, “incluindo nossa cidade na rota, contribuíram para o reconhecimento e a importância do papel dos museus, foi um resgate na valorização dos espaços de memória e cultura”, destacou Aquino.