Quando me perguntam qual é a oportunidade de aprendizagens que esta crise do coronavírus possibilita à sociedade brasileira de sair da senda do “País do Futuro”, que nunca chega, e passar a ser o “País do Presente”, eu não respondo apenas com o lugar-comum que seja a educação e a assimilação imediata das tecnologias de ponta em fusão no mundo digital, no mundo físico e no mundo biológico.
O Brasil não pode ficar fora da Quarta Revolução Industrial por falta de brasileiros qualificados e pelo uso precário de tecnologias obsoletas de informação. Aliás, o home office no Brasil, intensivamente utilizado neste momento de coronavírus, é caricato: governos nem empresas, em sua imensa maioria, estão preparados para o mundo digital que a modalidade exige. Em geral, ficamos em videoconferência e em troca de e-mails e de mensagens pelo whatsapp.
Estamos sempre adiando a implantação de tecnologias de ponta: ora pela ilusão nacionalista oriunda dos tempos do regime militar em que faríamos os nossos próprios hardwares e sofwares, ora pela resistência aos telefones celulares, ora pela discriminação contra a fibra ótica. E por aí vai.
Agora, resistimos à implantação da tecnologia 5G, quando nem conseguimos ainda universalizar o sistema 4G. O 5G no Brasil será americano ou chinês? É um tema eminentemente técnico, de alto interesse do país, passa a ser contaminado por credos e ideologias políticas.
Pelas idas e vindas, pelo “andar da carruagem” das indecisões nacionais, na melhor das hipóteses, só vamos começar a implantar a tecnologia 5G no Brasil a partir do ano 2022/2023. Continuaremos crescendo à velocidade do carro de boi enquanto a tecnologia avança à velocidade orbital.
Agora a história se repete como farsa e como tragédia: antes, ficamos fora da Primeira Revolução Industrial, exatamente, porque não fomos capazes, como nação, de assimilar, em extensão e profundidade, nos séculos XVIII e XIX, a educação universalizada e as tecnologias desenvolvidas à época. Ficamos a reboque da história.
O Brasil vive hoje uma crise total de sua economia. E não apenas agora decorrente da paralisação quase absoluta da economia mundial com a pandemia. Nos últimos 45 anos, desde as crises do petróleo em 1973/1974, só crescemos de forma mais substancial nos governos FHC, com o plano real, e no primeiro governo Lula. E mesmo assim, em taxas bem inferiores ao crescimento que o Brasil teve ao longo do Século XX até a terrível crise do petróleo de 73/74. Não há o que falar em década perdida, pois são décadas de decadência e de desempenhos pífios.
A única exceção é o agronegócio brasileiro – principalmente liderado por São Paulo e pela região do Centro-Oeste. O desempenho é tão espetacular que já alcançamos hoje o segundo e o primeiro lugares em produção agroindustrial em todo o mundo: grãos e frutas, pecuárias bovinas e de frango, suínos e de peixes. Há um país que dá certo, que é o nosso agronegócio! E por isso, continuamos mantendo a invejável posição de uma das 10 maiores economias do mundo.
Mas você me pergunta como tirar proveito da crise do coronavírus? É preciso aprender com a experiência. E experiência não é o que acontece com a gente, mas o que a gente faz com o que acontece com gente. Para mim, acima de todas, a mais relevante dimensão que deve ser superada não é o vírus, que será dentro em pouco vencido pela ciência: tanto com remédios específicos que vão curar os infectados como pela descoberta da vacina que vai evitar a infecção.
O nosso maior inimigo são os nossos próprios demônios, que infeccionam o povo e as nossas elites. Santiago Dantas dizia que “o povo enquanto povo cumpre o seu papel, mas as elites enquanto elites não cumprem o seu papel.” A atual realidade brasileira nega essa assertiva do ilustre político e intelectual.
(*) Wagner Siqueira é diretor-geral da Universidade Corporativa do Administrador (UCAdm), conselheiro federal do Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro (CRA-RJ) e membro do conselho de administração do CIEE-RJ.