A despeito das pressões de setores conservadores minoritários, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC), em eloquente demonstração de coragem e empatia, lançaram nesta Quarta-feira de Cinzas, em edição ecumênica, a Campanha da Fraternidade de 2021.
Com o tema “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor” e o lema “Cristo é nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade”, a quinta edição ecumênica (realizada, em média, a cada cinco anos desde 2000) se propõe a promover uma reflexão engajada, voltada para a efetiva transformação da sociedade, fortalecendo a cultura de paz e o respeito à diversidade, no âmbito da teologia da esperança, em que amor não seja uma palavra vã em uma sociedade de vândalos.
Além de católicos, luteranos e batistas, entre outros evangélicos não fundamentalistas, se irmanaram neste momento de reflexões que coincidem com a Quaresma (período de 40 dias que antecede a Páscoa), em favor de um processo de pacificação e diálogo no interior da sociedade brasileira, profundamente dividida pela difusão do ódio e da intolerância, sobretudo nos últimos três anos.
O Papa Francisco, durante a missa da Quarta-feira de Cinzas, enviou mensagem de apoio à Campanha da Fraternidade, num claro gesto de sintonia com a postura cidadã da CNBB e seu parceiro CONIG. Como nunca, o amor, a empatia e a esperança se revestem de caráter transformador, pela solidariedade inerente.
A campanha ecumênica se revela alvissareira ao tratar de temas álgidos em nossa desalentadora realidade imediata. Seja no frio enfrentamento à pandemia, na desmotivada campanha de vacinação ou no cotidiano em que apoiadores e membros do atual governo se declaram a favor do regime do temido Ato Institucional nº 5 (AI-5) e contra a Ciência e a Vida.
Não passa despercebido o real objetivo de medidas aparentemente desconexas: lançar as bases de um regime de caráter autoritário, inspirado nas piores ditaduras existentes nas décadas de 1960, 1970 e 1980 na América do Sul. A maior evidência deste propósito está, de um lado, nas reiteradas manifestações favoráveis ao regime de 1964 e, de outro, em decretos inconstitucionais de flexibilização das normas de controle de armas (com evidente propósito de armar simpatizantes do atual governo contra a oposição, tratada como inimiga).
Mais uma vez, a CNBB e o CONIC, de maneira lúcida e generosa, vêm contribuir efetiva e corajosamente para a reafirmação da cultura de paz, a teologia da esperança, a prática do respeito à diversidade e a comunhão baseada na verdade. Mais uma vez, o amor como instrumento de libertação vencerá o ódio, o recalque e a intolerância, que tanta dor e infelicidade têm trazido à nação nestes últimos anos.