Com o avanço da tecnologia, a velocidade das informações e da conectividade, ficou ainda mais evidente a necessidade de transformação nas empresas. Mesmo aquelas mais tradicionais, foram conduzidas a quebrarem paradigmas e pensarem em novas soluções, culturas, formatos de trabalhos e ferramentas. A chamada quarta revolução industrial está transformando a produção, comunicação, mobilidade, análise de dados, negociação e saúde, além da própria gestão de pessoas.
Muitas empresas e atividades deixarão de existir nos próximos anos. Novas habilidades vão se impor sobre as habilidades tradicionais e grande parte do uso da inteligência tradicional será transferida para máquinas e softwares.
Entretanto, a quantidade de empresas que fecham as portas por problemas de gestão, o aumento de casos de estresse e ansiedade em todo mundo abre espaço para uma discussão: a da relação da Inteligência Artificial (IA), que move esta quarta revolução industrial, com a Inteligência Emocional (IE). Mas e agora, como utilizar o melhor delas?
Ao lado dos algoritmos e das máquinas, a IA é capaz de simular a capacidade humana de raciocinar, tomar decisões e resolver problemas. E ela vai além, ao reduzir jornadas, indicar botões preferidos e aumentar a produtividade e agilidade de um trabalho ou atividade. Os maiores avanços dentro dessa inteligência acontecem na percepção e cognição dos sistemas. Junto disso, o reconhecimento por voz e análise de sentimentos também vêm se desenvolvendo a passos largos. Exemplos disso são a Siri, Alexa, Google Assistant, alguns controles de TV ou tecnologias mais “industriais”, como os serviços de machine learning das chamadas big techs (IBM, AWS, Huawei, etc). Um estudo realizado por James Landay, cientista de computação de Stanford, concluiu que o reconhecimento de voz já é cerca de três vezes mais rápido do que digitar em um celular.
Já a IE é a capacidade de identificar, racionalizar e organizar as emoções, avaliar os próprios sentimentos e os dos outros e, mais do que isso, lidar com eles com sabedoria. Segundo um levantamento realizado pela ONU, sobre 10 habilidades do futuro, a Inteligência Emocional aparece na 5ª posição e, segundo alguns pesquisadores, a IE está de braços dados com o sucesso pessoal e profissional, já que ela também virou uma característica competitiva no mercado de trabalho. Pessoas emocionalmente inteligentes têm características em comum, são mais confiantes, empáticas, motivadas, possuem consciência de atitudes, relacionam-se e se comunicam de modo mais equilibrado e encaram situações difíceis com mais assertividade.
A grande questão que se coloca então é como encontrar o equilíbrio adequado entre estas duas maneiras de se relacionar com os problemas reais da vida: a tomada de decisão, o uso do nosso tempo, a realização de atividades, a produção e o relacionamento com as pessoas e a gestão/RHs.
Evidentemente, não temos espaço aqui para discutir cada um desses campos. Por isso, minha intenção é trazer alguns insights apenas para uma das atividades essenciais da Administração de Recursos Humanos nas empresas, a do recrutamento e seleção de pessoas, campo que vem sendo invadido por tecnologias ligadas à IA.
Sistemas e ferramentas que utilizam Inteligência Artificial ajudam a, não apenas encontrar as melhores pessoas para as diversas atividades, mas permitem também construir trajetórias mais adequadas para encontrar os melhores colaboradores. O aprendizado da máquina pode ser utilizado não apenas para escolher os candidatos com as habilidades técnicas mais adequadas, mas também para evitar vieses de qualquer natureza, frequentes nos algoritmos tradicionais. Além disso, algoritmos também ajudam a analisar sentimentos a partir da interação com os indivíduos e alertar para eventuais dificuldades da empresa ou do candidato vindas do âmbito das emoções (IE).
A importância de combinar IA com IE no mundo da gestão deve considerar dois dos fatores mais importantes para o mundo dos negócios: o do desempenho e o da inovação. Frequentemente, o desempenho está associado à excelência na execução, à disciplina nos processos, que são frutos da repetição, do aperfeiçoamento e do que estudiosos denominam melhoria contínua. Este é, sem dúvida, o grande e principal campo da Inteligência Artificial. Por isso, medimos grande parte dos efeitos da IA em termos de redução de tempo para execução de tarefas, desde as mais simples de uma linha de produção até atividades mais complexas, como a da redação de uma peça jurídica ou análise de uma tomografia computadorizada.
Também avaliamos a IA por sua capacidade de acertar mais ou errar menos, independente do campo de aplicação. Por sua vez, a inovação está associada a outras competências, a maioria delas ainda muito próprias dos humanos, apesar das investidas da IA neste campo também. Trata-se de competências ligadas à capacidade de reagir ao imprevisto, capacidade de criar e pensar diferente, bom senso e capacidade de abstrair. Este é o campo da Inteligência Emocional e ela está relacionada à tomada de decisão em momentos difíceis, à resolução de problemas muito complexos e que exigem olhar para o futuro com quase nenhuma base do passado e, em última análise, em como melhor aproveitar-se da própria Inteligência Artificial.
Até onde a Inteligência Artificial vai substituir funções hoje humanas? Até onde a Inteligência Emocional pode contribuir para um melhor uso da IA? A este ponto, já assistimos a IA criar emoções, portanto, agora temos que equilibrar as vantagens das ferramentas e saber como extrair o melhor de cada inteligência em nosso negócio. O grande desafio do século não seja talvez apenas investir em inovação, em tecnologia ou apenas em pessoas, mas sim, em equilibrar e aperfeiçoar tantas possibilidades que já temos diante de nós.
* Celson Hupfer, CEO da Connekt e Doutor em Psicologia Social
**Celson Hupfer é fundador e CEO da Connekt, plataforma inteligente de recrutamento digital. Com mais de 30 anos de experiência como executivo no segmento financeiro, planejamento estratégico, análise de riscos e área comercial, já passou por cargos de diretoria no antigo BankBoston e no Itaú. Também foi consultor autônomo em um empreendimento próprio. Doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) e membro do conselho do mestrado profissional da Fundação Dom Cabral, é especialista em liderança, tendo liderado equipes de mais de 1.500 colaboradores e implantado programas de expansão. Formado em Economia pela USP, com curso em Psicanálise no Instituto Sedes Sapientiae.