Acostumada a brigar pela ponta do mercado, primeiro com o Uno e depois com o Palio, a Fiat sofreu com a chegada dos rivais Chevrolet Onix e Hyundai HB20. Lançados em 2012, eles estabeleceram um novo padrão de carro compacto e, não por acaso, ocupam atualmente o posto de líder (Onix) e segundo lugar (HB20) no ranking de vendas. A resposta da Fiat chega apenas agora com o Argo, que investe na diversidade de versões para atender a uma ampla gama de consumidores. Só que a demora da marca italiana permitiu que os rivais também evoluíssem no ano passado, com reestilização, novos equipamentos e evoluções mecânicas.
Para balizar a chegada do Argo, optamos por reuni-lo com os principais concorrentes nas versões topo de linha com câmbio automático neste primeiro comparativo – aliás no nosso novo formato de comparativos, como você verá a seguir. Assim, pudemos observar (e avaliar) o máximo que cada um pode oferecer. Ficamos com o Argo Precision 1.8, o HB20 Premium 1.6 e o Onix LTZ 1.4 – todos com preço entre R$ 60 mil e R$ 70 mil.
Espaço e praticidade
Ciente da “crescida” dos rivais, a Fiat resolveu deixar o Palio de lado e partir para um novo projeto com base no Punto. Assim nasceu a MP1, nova plataforma dos compactos da Fiat, que aproveita cerca de 20% dos componentes do Punto e muito das medidas dele, mas com um novo arranjo de carroceria para privilegiar o espaço.
Do trio aqui comparado, o Argo é o que mais se aproxima dos 4 metros de comprimento, embora tenha basicamente a mesma distância entre-eixos do Onix (2,52 m). A largura do Fiat também é a maior, com 2 cm a mais que o Onix e 4 cm extras em relação ao HB20. E ele ainda é o mais alto, sendo o único a superar os 1,50 m de altura. De fato, o Argo comprova a teoria com a melhor acomodação dos ocupantes na prática.
No banco traseiro, o Fiat é o mais indicado para levar três pessoas, por sua maior área para os ombros e cabeça. Também é do Argo a maior distância entre os joelhos dos ocupantes traseiros e os encostos do bancos dianteiros. Na frente, porém, os designers levaram vantagem sobre os engenheiros e os puxadores de porta acabaram muito volumosos, batendo na perna do motorista e passageiro.
Em segundo aparece o Onix, com boa acomodação para quatro ocupantes e bastante espaço para o motorista. Pena sua posição de dirigir ser um tanto elevada, mesmo com o banco na posição mais baixa – o Argo é elevado, mas não tanto, enquanto o HB20 é notavelmente o mais para baixo. O GM é o único que tem ajuste somente de altura do volante. Nos demais, há ajuste de altura e profundidade.
O Hyundai agrada na frente, mas é acanhado atrás. Além disso, a elevada linha de cintura lateral deixa o vidro das portas traseiras um tanto alto, reduzindo a iluminação da cabine e ampliando a sensação de aperto. Ao menos o porta-malas iguala os 300 litros do Argo, ainda que o compartimento do Fiat pareça um pouco maior.
O Argo tem também os melhores bancos (com ajuste milimétrico do encosto quando equipado com airbags laterais) e o volante de melhor pegada, com base reta. Onix e HB20 ainda insistem no ajuste de altura do banco por roldana giratória, que só muda a inclinação do assento, enquanto o Fiat traz a prática alavanca de subir o banco todo. No Hyundai o volante é o maior e de pegada mais fina, destoando do conjunto.
O novo Fiat fica devendo apenas em porta-objetos, principalmente entre os bancos, onde Onix e HB20 oferecem diversos compartimentos, e também no console da alavanca de câmbio, onde o Hyundai traz até um local com tampinha corrediça ideal para guardar celular e carteira longe de olhares indiscretos.
Acabamento e equipamentos
Outro argumento do Argo está no bem-estar a bordo. É dele o painel mais bonito e bem acabado, sendo o único a vir com uma tela TFT entre os mostradores analógios do cluster – de 3,5″ de série ou de 7″ colorida como opcional. Assim como os rivais, o Fiat usa plástico rígido nas peças do interior, mas as texturas e a faixa em cinza fosco atravessando o painel dão a ele um aspecto de carro mais caro. Também vale destacar a central multimídia “flutuante”, de fácil acesso no alto do painel, e com desenho que lembra muito o Mercedes Classe A – incluindo as três saídas de ar circulares abaixo do sistema.
De projeto mais recente, o Argo é o único a vir de série com controles de tração e estabilidade, além do sistema stop/start que ajuda a economizar combustível na cidade, desligando o motor em paradas curtas. Também só o Fiat pode vir com câmera de ré, retrovisor interno fotocrômico e chave presencial com partida por botão (opcionais). Ar digital está presente no Fiat e no Hyundai, bem como o recolhimento elétrico dos retrovisores externos e os airbags laterais (de série no HB20). O Argo pode vir ainda com rodas aro 16″ (opcionais no lugar das 15″ de série), contra as 15″ dos oponentes.
O Onix não esconde ser um carro mais barato que os demais, com plástico de aspecto mais simples no painel e laterais de porta, bem como na ausência de itens de conforto e comodidade. Ele não oferece ar digital e seus bancos são apenas parcialmente revestidos de couro (o centro é de tecido). No entanto, é o HB20 que parece ter sentido mais o passar dos anos. Seu painel é bem montado, mas o desenho está datado e o quadro de instrumentos que já foi destaque (por ser semelhante ao do Elantra da época) hoje fica devendo atrativos como um velocímetro digital na telinha central – bom para evitar multas em nossas cidades cada vez mais recheadas de radares. Pelo menos só o Hyundai traz iluminação para os espelhos do para-sol, uma falta sentida principalmente no Argo.
Na parte de entretenimento, os três vêm com centrais multimídias com tela de 7″ sensível ao toque e sistemas Apple Car Play e Android Auto. A do Fiat se destaca pela alta resolução da tela, mas não podemos dizer o mesmo da câmera de ré (opcional). A do Hyundai tem layout um pouco antigo e comandos lentos, mas traz GPS nativo. Já a do Onix (My Link 2) é a mais intuitiva de usar e com a melhor recepção do rádio.
Ao volante
Dos três motores oferecidos no Argo, o 1.8 E-TorQ é o de concepção mais antiga. Gera vistosos 139 cv de potência e 19,3 kgfm de torque e agora está aliado a uma transmissão eficiente, automática de 6 marchas. É o mesmo conjunto que move a picape Toro em suas versões de entrada. Então seria de se imaginar que o Argo fosse um foguetinho, mas não é bem assim.
A Fiat sabe que, para render bem, esse motor precisa de giro e consequentemente, bebe um bocado. Então a engenharia adotou uma programação pra lá de conservadora para o câmbio automático. Saia acelerando de forma suave e ele vai jogar terceira marcha a 30 km/h, quarta a 40 km/h e quinta a 50 km/h… Daí quando você precisar de uma resposta rápida para mudar de faixa, por exemplo, você terá de pisar fundo enquanto o câmbio reduz as marchas que não devia ter subido para então o carro ganhar força. Ou seja, o Argo não parece ter o fôlego que tem numa condução normal. Nas subidas, às vezes irrita a ponto de termos que chamar uma marcha pra baixo na borboleta do volante.
Esse acerto, digamos, econômico do Argo também encontra no peso de 1.264 kg um aliado contra a performance – o HB20 pesa 1.071 kg e o Onix 1.042 kg. Assim, não chegou a ser surpresa que o Fiat não conseguisse desbancar o Hyundai nas nossas medições de desempenho. Acelerou junto até 80 km/h e ficou um pouco para trás nos 100 km/h. Só venceu com autoridade na retomada de 80 a 120 km/h e nas frenagens, ajudado pelas rodas aro 16″ com pneus mais largos (195/55).
Na “vida real”, porém, é o Hyundai que se revela o mais ágil nas saídas e ladeiras, principalmente na cidade. O motor 1.6 é esperto e joga muito bem entrosado com o câmbio automático de 6 marchas, o mais suave do trio nas passagens de marcha – e sem as trocas ascendentes exageradas do Argo. O problema é que essa agilidade cobra seu preço no consumo, o mais alto do comparativo em nossas medições. O HB20 registrou 7,2 km/l de média na cidade e 11,9 km/l na estrada, com etanol, diante de 7,6 km/l e 12,1 km/l do Argo, respectivamente, e de 7,9 km/l e 12,5 km/l do Onix, na ordem. Um ponto a ser revisto no Hyundai é a direção hidráulica, que rouba mais potência do motor que o sistema elétrico (já presente no aventureiro HB20X) e compromete o consumo.
Como esperado, o Onix se deu bem em economia de combustível, mas ficou para trás nas provas de performance. Não há milagre: o motor 1.4 de apenas 8 válvulas dá conta do recado com seu bom torque em baixas rotações, no entanto, sua menor força fica clara em velocidades de viagem. Na cidade, ele agrada por responder de bate-pronto, sem ter que esperar o motor encher. Em giros mais altos, porém, o motor da GM é o mais ruidoso e menos suave de funcionamento, em posição ao “lisinho” propulsor da Hyundai.
Na última mudança ocorrida em 2016, o Onix ganhou direção elétrica e suspensão mais baixa, esta última para reduzir o arrasto aerodinâmico e consequentemente o consumo. Acabou que o hatch da GM ficou mais “na mão” do que nunca, com menor inclinação nas curvas que os rivais, além de sua direção ter o maior “peso” e mais comunicação com o motorista. Mas ele pula demais em pisos ondulados. O Argo fica no meio termo entre a firmeza do Onix e a maciez excessiva do Hyundai, com dinâmica bem equilibrada, volante leve sem ser “bobo” e bom trato com as imperfeições do solo. Por último, o HB20 revela o comportamento mais pobre dos três, sendo incapaz de absorver bem os buracos e deixando a carroceria rolar demais nas curvas e desvios rápidos. A direção também carece de melhor acerto: é pesada nas manobras e fica muito leve na estrada.
Compra e manutenção
Com motor menor e menos equipamentos, o Onix tem a receita para ser mais barato. Sai por R$ 61.950 já com rodas de liga, bancos parcialmente revestidos de couro, central multimídia e o exclusivo sistema OnStar de concierge e monitoramento. Há pouco tempo, o campeão de vendas foi alvo de um crash-test pelo Latin NCAP no qual ele zerou no teste de impacto lateral. A GM alegou mudanças nos critérios e disse que o Onix atende à legislação em vigor. Fato é que seria necessário fazer exatamente o mesmo teste com o HB20 e o Argo antes de crucificar somente o modelo da Chevrolet.
Mais barato de comprar, o Onix tem também o menor custo de seguro, com média de R$ 1.940 para nosso perfil estipulado (homem, 35 anos, casado, morador da zona oeste de São Paulo). A garantia é de 3 anos e o valor das revisões durante o período (ou 30 mil km) fica em R$ 1.252.
O HB20 tem preço bem mais próximo do Argo, mas a Hyundai aproveitou para baixá-lo na linha 2018: R$ 66.830. É dele a garantia mais longa, de 5 anos, com gasto de R$ 1.246 para as três primeiras revisões (até 30 mil km). No entanto, o modelo da Hyundai sofre com o seguro elevado, chegando a R$ 2.920 quando cotado no mesmo perfil que usamos para o Onix.
Por fim, o Argo tem preço (R$ 67.800) próximo ao do HB20, com a vantagem do ESP de série. No entanto, a maioria dos atrativos do Fiat são opcionais mesmo nesta versão Precision, caso do ar digital – vendido num pacote em conjunto com a tela de 7″ no cluster, chave presencial e partida por botão, sensores crepuscular e de chuva e rebatimento elétrico dos retrovisores, tudo por R$ 3.500. Câmera de ré e sensor de estacionamento saem por mais R$ 1.200, enquanto as rodas aro 16″ vêm junto com os bancos de couro por outros R$ 2.200 extras. Some ainda os R$ 2.500 dos airbags laterais e chegamos a R$ 77.200 num Argo 1.8 como o testado. O gasto com revisões até 30 mil km é de R$ 1.292. Ainda não conseguimos cotações do seguro para o modelo, mas, pelo histórico do Punto, deverá ficar entre a do Onix e a do HB20.
Conclusão
O Argo traz realmente algo de novo para brigar com os mais vendidos. Supera os mais antigos em porte, espaço, bem estar a bordo, acabamento, equipamentos e segurança. Poderia ter ido além no ajuste do câmbio automático, que teve de “capar” o motor para não pesar no consumo. O problema maior, entretanto, está no preço da novidade. O Argo oferece mais e cobra por isso. E a julgar pelas vendas do Onix, o mais barato com ampla margem, dinheiro ainda conta muito entre os compactos, mesmo em suas versões de topo. A Fiat precisará ser mais agressiva nos valores para encarar os líderes em volume.
Fichas técnicas
Fiat Argo Precision | Hyundai HB20 Premium | Chevrolet Onix LTZ | |
MOTOR | dianteiro, transversal, 4 cilindros, 16 válvulas, 1.747 cm3, comando simples variável, flex | dianteiro, transversal, 4 cilindros, 16 válvulas, 1.591 cm3, duplo comando variável na admissão, flex | dianteiro, transversal, 4 cilindros, 8 válvulas, 1.389 cm3, comando simples, flex |
POTÊNCIA/TORQUE | 135/139 cv a 5.750 rpm / 18,8/19,3 kgfm a 3.750 rpm | 122/128 cv a 6.000 rpm / 16/16,5 kgfm a 5.000 rpm | 98/106 cv a 6.000 rpm / 13/13,9 kgfm a 4.800 rpm |
TRANSMISSÃO | automática de 6 marchas; tração dianteira | automática de 6 marchas; tração dianteira | automática de 6 marchas; tração dianteira |
SUSPENSÃO | independente McPherson dianteira e eixo de torção na traseira | independente McPhseron na dianteira e eixo de torção na traseira | independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
RODAS E PNEUS | liga leve de aro 16″ com pneus 195/60 R16 (opc.) | alumínio de aro 15″ com pneus 185/60 R15 | liga-leve aro 15″ com pneus 185/65 R15 |
FREIOS | discos ventilados na dianteira e tambor na traseira com ABS e EBD | discos ventilados na dianteira e tambor na traseira com ABS e EBD | discos ventilados na dianteira e tambor na traseira com ABS e EBD |
PESO | 1.264 kg em ordem de marcha | 1.071 kg em ordem de marcha | 1.042 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 3.998 mm, largura 1.724 mm, altura 1.507 mm, entre-eixos 2.521 mm | comprimento 3.920 mm, largura 1.680 mm, altura 1.470 mm, entre-eixos 2.500 mm | comprimento 3.933 mm, largura 1.705 mm, altura 1.476 mm, entre-eixos 2.528 mm |
CAPACIDADES | tanque 48 litros; porta-malas 300 litros | tanque 50 litros; porta-malas 300 litros | tanque 54 litros; porta-malas 280 litros |
PREÇO | R$ 67.800 | R$ 66.830 | R$ 61.950 |
Fonte: Motor 1