O nadador Guilherme Costa, também conhecido pelo seu apelido, ‘Cachorrão’, é considerado uma das maiores ascensões da natação brasileira desde o Rio 2016. Integrante da Seleção Brasileira, no ano passado ele quebrou o seu oitavo recorde sul-americano da carreira e este ano ainda venceu o atual campeão olímpico e mundial em um torneio internacional nos 800m e 1500m nado livre. Qual será o segredo desta ascensão meteórica?
Além da extrema dedicação e disciplina, que são necessárias a todos os atletas de alto rendimento, e da orientação estratégica do treinador Rogério “Kafu” Karfulkenstein que foi eleito o melhor treinador do Brasil e da América do Sul em 2017, está o grande diferencial: o uso do coaching, que é um processo, uma metodologia, um conjunto de competências e habilidades que busca desenvolver o seu máximo potencial, contando com o auxílio de um profissional, chamado coach.
A tarefa de realizar este trabalho com o atleta foi confiada ao coach Lincoln Nunes, que é uma das maiores autoridades em coaching do Brasil, e está desde 2017 trabalhando com Guilherme: “Estudo performance e desenvolvimento humano há mais de 10 anos e posso afirmar com certeza que a pessoa que estiver fisicamente bem preparada pode fazer coisas incríveis, mas quem alinha e conecta hábitos extraordinários ao corpo e a uma mente fortalecida, é capaz de gerenciar melhor suas emoções e por isso obtém resultados excepcionais em todas as áreas.
Lincoln Nunes revela os segredos que fizeram o atleta Guilherme Costa alcançar o que era praticamente impossível e se tornar o maior recordista sul-americano nos 1500m e nos 800m nado livre.
O início
Eu já tinha experiência com atletas de elite, no jiu-jitsu. Muda-se a modalidade esportiva, mas as dores, limitações, crenças, bloqueios geralmente se repetem, e eu entendo da parte mental, do ser humano. Então após a minha contratação iniciamos os trabalhos imediatamente. Passei a me dedicar intensivamente com o Guilherme e seu Técnico Kafu, passamos literalmente 24 horas por dia juntos pra poder entender o modelo de mundo do Gui. Pra ele poder extrair o seu melhor eu precisava entender como ele pensava e agia perante as adversidades, entender o relacionamento dele com os pais, o comportamento nos treinos intensos, os pensamentos que alimentava e a tratativa com os amigos e a relação técnico/atleta, detalhes esses extremamente importantes que jamais poderiam passar desapercebidos.
O processo
Aproximadamente 25 dias depois do início do meu trabalho com o Guilherme, ele teria uma competição regional em Santos e nadaria os 1500m nado livre. O Gui estava treinando muito intensamente e não teria o descanso necessário para a competição. Quando perguntei para o Guilherme qual era o tempo previsto para essa competição, ele disse que próximo dos 15’26”. Apenas 4 meses antes ele tinha nadado o Campeonato Brasileiro e conseguiu a marca de 15’14” (melhor tempo dele na época). Como havia estudado outros nadadores com ótimas marcas já sabia que o recorde Sul-Americano era 15’08”57, logo, pensei, essa é uma ótima marca a ser atingida nesse início de trabalho, pois já tínhamos uma referência.
Aí surgiu a grande meta, fazer 15’08” (baixo), com essa marca quebraríamos o recorde sul-americano, Guilherme me olhou sem entender nada. A verdade é que, a meta era extremamente audaciosa, ninguém acreditava ser possível, eu sabia que poderíamos atingi-la, um atleta com um grande potencial, altamente focado com uma equipe multidisciplinar e um técnico absolutamente qualificado com muita experiência, iríamos trabalhar o processo mental e a fórmula do sucesso estava pronta. Refletimos e o Guilherme escreveu a meta em um papel e colocou na sua geladeira, para que ficasse visível e exposta, dessa forma todos os dias ele olharia para a grande meta, e ela estaria lá sorrindo pra ele.
Certo de que criamos a história, vendo a evolução do Guilherme no curto período de trabalho mental vi a oportunidade de criar uma meta ainda 10x mais ousada, nesse momento é que vivenciei uma das partes mais desafiadoras desse processo, o que antes era 15’08” passei para 15’05”, naquele momento a mente fraquejou e tanto o atleta quanto a equipe se subestimaram e não acreditaram na marca a ser cravada. Sendo um coach profissional acostumado com os desafios, essa atitude pra mim era natural, pois muitas vezes me deparo com profissionais que não conseguem expor todo seu potencial por crenças limitantes.
Logo depois que estabelecemos esse novo desafio extremamente audacioso, traçamos uma estratégia para concluir esta meta com êxito. Foram incansáveis sessões de coaching, trabalhando quebra de crenças, postura, mindset e várias outras coisas que estavam impedindo o Gui e toda equipe de atingir o máximo potencial, mesmo assim, o medo ainda pairava na mente e nas ações do Guilherme e do grupo de trabalho, os questionamentos mentais e a busca pela zona de conforto se potencializam no momento que uma grande meta é estipulada, nessa hora o cérebro reptiliano grita.
Eu certo de minhas ações, e com o conhecimento e todo potencial da equipe do Gui e do técnico, corri o risco de ter o meu contrato encerrado por conta da meta extremamente ousada, toda equipe queria o melhor para o atleta, evitar uma possível frustração caso a grande meta não fosse batida, mas sabia que o risco valeria a pena, pois estávamos no caminho certo. Ele tem o melhor técnico do Brasil em provas de fundo (longas) que a muitos anos vem fazendo um trabalho incrível, o que o limitava de atingir todo seu potencial era ele mesmo e a sua própria mente, e isso é algo muito comum no mundo esportivo.
O Grande Dia
Certo de que o Guilherme estava preparado chegou o grande dia da competição. E o que parecia impossível se concretizou, o grande atleta Guilherme Costa havia nadado por 15 minutos e bateu o tempo cravado de 15’05”23, essa era a meta a ser batida, antecipamos um ano e meio da sua jornada. Quebramos o recorde sul-americano, na época era 15’08”57, esse tempo se mantinha desde 2013, tornando-se uma atração mundial, saindo em diversos sites do mundo, de lá pra cá Guilherme já bateu 4x o recorde sul-americano nos 1500m nado livre e 4x vezes o recorde sul-americano dos 800m nado livre, representando a seleção brasileira diversas vezes, tornou-se o primeiro nadador da América Latina a nadar os 1500m nado livre abaixo dos 15 minutos, fazendo a marca de 14’59”01.
Os desafios continuam
Este ano no mês de junho/2019 Guilherme participou do torneio Sette Colli na Itália e venceu dentro da casa do atual campeão olímpico e mundial nas provas 1500 e 800 metros nado livre. Quando perguntei para o Guilherme se um dia ele imaginava vencer o campeão mundial e olímpico dentro da casa dele, ele respondeu: “até eu iniciar o meu processo de coaching eu jamais imaginava que esse grande feito seria possível, de um tempo pra cá comecei a acreditar fortemente nessa possibilidade, estou treinando mais forte do que nunca, adquiri novas habilidades e minha mente está muito mais confiante e fortalecida”.
Seguimos trabalhando forte e o nosso sonho continua, Guilherme Costa está embarcando neste momento para a Coréia onde vai representar o Brasil no campeonato mundial, depois vem o Pan Americano, após essas competições o foco total será as olimpíadas de Tóquio em 2020, acreditamos que estamos no caminho certo e os resultados do Guilherme nos confirmam isso, temos muito trabalho pela frente, sabemos do potencial dele e já estamos fazendo história.