O Brasil escolheu a volta da democracia ao derrotar nas urnas, no voto, um governo que segue ameaçando que todos tenham lugares e oportunidades iguais. Essa vitória só foi possível porque a candidatura do Lula foi longe para costurar apoios em busca de fortalecer o tecido social. Longe a ponto de juntar Boulos e Armínio Fraga, Marina Silva e Simone Tebet. Não há jeito de seguirmos embarricados.
A democracia só pode ser real e coerente se for com a coexistência e diálogo entre quem é diferente. É essa a oportunidade que o Brasil tem neste momento – admitir que que ameaça a democracia brasileira é a branquitude e trazê-la à prática. E o jornalismo, para ser pilar da reconstrução, precisa recosturá-la por dentro de si.
O futuro do jornalismo é local, independente e diverso. É feito por jornalistas que moram perto e dialogam com as pessoas, conhecem as necessidades, as contradições e as complexidades da realidade social. Fala a partir da vivência sobre realidades sensíveis e não sensacionalistas, buscando mostrar e descontruir estereótipos que violentam.
Ser esse jornalismo nos demanda reconstruir nossas pontes com a divergência respeitosa – e nós três, Simone, Amanda e Elaine, estamos travando também, neste momento, essa difícil missão. Tendo isso como base, não podemos implodir o diálogo com nosso território, nossa família. Temos de defender nossos valores e a busca por uma sociedade que reduza desigualdades e valorize a potência das diferenças. E também escutar o que tem a dizer quem diverge e acolher o que for existência e diferença – não for violência e morte.
Não precisamos, nem podemos eliminar o outro – mas o preço disso não pode ser o silenciamento. Diversidade não pode ser divisão. Temos de coexistir. E é preciso que nós, jornalistas, convivamos na diferença, com harmonia, a partir da premissa de que todos têm direito.
A democracia não pode apagar diferenças, e o jornalismo também não pode. Dentro das redações e organizações, precisamos de todes, juntes, sedimentando dentro o que pregamos para a sociedade. Querer as diferenças e com elas reformular as equipes, processos e pautas para cumprir nossa função social de trazer a democracia racial à prática.
Nesse momento histórico, a função do jornalismo é radicalizar a democracia e a coexistência harmônica como caminho de transformação a partir das caneladas e das (auto)críticas.
Coexistência harmônica não quer dizer à base de aplausos e falta de crítica. Viver na diversidade é abraçar a divergência, não é fácil, dá pau e traz desconforto, demanda aceitar que nem todo mundo se sente incluído e reconhecer e largar mão de privilégios. E é conviver com a limitação fática de que nunca faremos o suficiente para inverter a estrutura racista que nos suporta.
A Énois celebra os 13 anos neste sábado, dia 5 de novembro, das 14h às 21h, com uma festa na laje da Casa do Povo e para celebrar com a gente chamamos todos que fazem parte dessa trajetória de construção por um jornalismo que ecoe a sociedade.
Queremos celebrar a Énois, o jornalismo e a democracia. E queremos fazer isso com todos que sabem que isso precisa ser feito: quem aplaude e também quem já nos deu ou levou canelada, quem aprova e quem questiona nosso jeito de fazer – porque é agressivo, porque é consensual demais, porque nasce das mulheres brancas aliadas.
Se você sente na sua pele que é a hora de celebrar e fortalecer, a democracia e o jornalismo, venha. Como bem nos orienta nossa conselheira Fabiana Moraes em seu novo e necessário livro, a pauta é a arma de combate do jornalismo. E ela tem de ser diversa e democrática.
A rede primordial que temos somos nós. Precisamos nos acolher, para acolher nossas discordâncias, pra que a gente se fortaleça nas críticas. Diversidade é força. Democracia depende de diversidade.
*Amanda Rahra, Simone Cunha e Elaine Silva, diretoras da Énois