Todo apaixonado por animais fala com seu bichinho de estimação. E traduz, à própria maneira, gestos, lambidas e rabos abanando. Mas gostaria mesmo é de ter certeza do que o pet quer “dizer”. Talvez esse sonho não esteja tão longe de se tornar realidade.
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O Earth Species Project (ESP) é um grupo da Califórnia, sem fins lucrativos, que almeja justamente isso: decodificar a comunicação animal usando uma forma de inteligência artificial (IA) com machine learning. Além de fazer a alegria dos donos de animaizinhos, isso, claro, seria uma revolução na forma como os tratamos (e como os protegemos). Para se ter uma ideia, foi um álbum de canções de baleias de 1970 que estimulou a proibição de caça a esses gigantes marinhos.
Criado em 2017 com a ajuda de grandes doadores, como Reid Hoffman, cofundador do LinkedIn, o ESP se diferencia de outras organizações que estudam a linguagem de animais específicos porque sua meta tem um pouco de megalomania: quer decodificar a comunicação de todas as espécies.
Ainda que seus pesquisadores reconheçam que há uma chance maior de encontrar comunicação rica e simbólica entre animais sociais (como primatas, baleias e golfinhos), eles entendem que podem desenvolver ferramentas que possam ser aplicadas para todo o reino animal: de vermes a rinocerontes.
Há um precedente que justifica essa crença: a tecnologia de machine learning já se mostrou útil para traduzir línguas humanas distantes entre si sem ter qualquer conhecimento prévio. O processo começa com o desenvolvimento de um algoritmo para representar palavras em um espaço físico. Nessa representação geométrica multidimensional, a distância e a direção entre os pontos (palavras) descrevem o grau de relacionamento entre elas e sua relação semântica.
Um exemplo: “príncipe” tem uma relação com “homem”, da mesma forma que “princesa” tem uma haver com “mulher”. O machine learning não precisa saber o que as palavras significam, ele apenas identifica com que frequência elas aparecem perto umas das outras.
O objetivo do Earth Species Project é reproduzir essa associação na comunicação animal e então identificar se há alguma sobreposição com a linguagem humana.
Outro projeto deles envolve o uso de Inteligência Artificial (IA) para gerar novos chamados de animais, tendo baleias jubarte como espécie de teste. Os novos chamados – feitos pela divisão de vocalizações em microfonemas (unidades distintas de som com duração de um centésimo de segundo) e usando um modelo de linguagem para “falar” algo como uma baleia – podem então ser reproduzidos para ver como os animais respondem.
Se a IA puder identificar as distinções entre uma mudança aleatória e uma significativa do ponto de vista semântico, vai nos aproximar da comunicação de fato entre os animais. “É fazer com que a IA fale a língua, mesmo que ainda não saibamos o que isso significa”, explica um dos líderes do projeto.
O ESP tem a ambição de ser o primeiro a aplicar o machine learning para avaliar automaticamente o que um animal está fazendo (por exemplo, se está se alimentando, descansando, viajando ou socializando) e, em seguida, adicionar dados de áudio para ver se há chamados vinculados a esse comportamento.
Essa técnica será aplicada inicialmente aos dados de baleias jubarte – o laboratório marcou vários animais no mesmo grupo para que seja possível ver como sinais são dados e recebidos. No futuro, pode ser aplicado ao seu gatinho manhoso. E vai ficar mais simples entender sua indiferença ou seu comportamento independente. Talvez ele mesmo te “diga” os motivos.