São Paulo (SP) – O Legado das Águas, maior reserva privada de Mata Atlântica do país, conquistou um avanço significativo no estudo da ecologia da onça-parda (Puma concolor) e da onça-pintada (Panthera onca). Com a captura de um indivíduo de cada espécie em um sítio no entorno da reserva, será possível realizar uma análise inédita do comportamento e da distribuição dessas espécies no bioma Mata Atlântica. As onças receberam um rádio-colar GPS/Satélite e foram devolvidas à natureza no exato local de captura.
De acordo com Sandra Cavalcanti, pesquisadora e presidente do Instituto para a Conservação dos Carnívoros Neotropicais – Pró-Carnívoros, que trabalha no levantamento, avaliação e monitoramento dos predadores de topo de cadeia no Legado das Águas, a onça-parda, apesar de se adaptar mais fácil aos diversos ambientes e de ter uma distribuição territorial maior, é bem menos estudada do que a onça-pintada.
“É a primeira vez que conseguimos monitorar uma onça-parda em ambiente de Mata Atlântica. Até então as pesquisas eram feitas de forma indireta, por meio de registros fotográficos. Poderemos acompanhar intensivamente as atividades dela, recebendo informações do rádio-colar GPS/Satélite a cada uma hora. Conseguiremos descobrir por onde ela caminha, como utiliza o habitat, e possivelmente, até estudar seus hábitos alimentares”, diz Sandra.
No caso da onça-pintada, a pesquisadora reforça a importância do monitoramento por ser uma espécie ameaçada de extinção. “Estima-se que restam apenas de 250 a 350 indivíduos na natureza. A captura e monitoramento desse animal representa mais do que estudar e entender seu comportamento. Representa a oportunidade de mostrar para a comunidade a importância da espécie e de sua preservação”, explica Sandra.
Para a gerente executiva da Reservas Votorantim, Frineia Rezende, a instalação do rádio-colar em indivíduos de duas espécies tão significativas para a Mata Atlântica trará ganhos ainda mais relevantes para o trabalho de conservação desenvolvido no Legado das Águas desde sua criação. “Esse monitoramento nos ajudará a conhecer a área de vida desses espécimes, além de contribuir para o manejo de atividades já realizadas na Reserva. É um ganho não só para o Legado e o Vale do Ribeira, mas para a comunidade científica de modo geral, que terá acesso a dados estratégicos relevantes”, afirma.
Parceria
A conquista é resultado de um trabalho de pesquisa realizado desde 2014 no Legado das Águas, em parceria com o Instituto Pró-Carnívoros, com a Prefeitura de Juquiá e com a própria sociedade, dando origem ao Plano de Manejo da Fauna Silvestre.
De acordo com Rafael Guimarães, chefe da Divisão Agrícola e Ambiental da Prefeitura de Juquiá e coautor do plano desenvolvido em parceria com Fernanda Nardino, coordenadora do Núcleo de Zoonoses da Prefeitura de Juquiá, e Beatriz Beisiegel, do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros-CENAP/ICMBio, o projeto inclui não só o trabalho de educação ambiental, mas também a conscientização a respeito da importância da onça para o equilíbrio do ecossistema.
Além disso, segundo ele, foram estruturados os procedimentos que seriam adotados em casos de aparições do animal, de forma a evitar a perda de indivíduos, alvo de caça em muitas das comunidades próximas às florestas.
O proprietário do sítio que fica nas localidades onde as onças foram capturadas, Adenir Torres Lima, trocou o medo pelo conhecimento. “Antes eu não sabia nada sobre onças. Tinha muito medo. Com esse tempo em que a equipe do Pró-Carnívoros ficou aqui, aprendi bastante. Agora entendo qual é o papel das onças na natureza, e como eu posso me proteger e proteger a espécie. A principal lição que aprendi é que eu e elas podemos viver em harmonia tomando os devidos cuidados”, explicou Lima.
Educação Ambiental
Em paralelo às pesquisas e estudos das onças que continuarão, agora mais ricos, com os dados emitidos pelos rádios-colares, o Legado das Águas e a Prefeitura de Juquiá, com o apoio do Pró-Carnívoros, colocarão em prática um Plano de Educação Ambiental para a conscientização da importância desses felinos, que são predadores topo de cadeia.
“Precisamos mostrar para a comunidade, lideranças e poder público o quanto as onças são importantes dentro de um ecossistema e a consequência negativa caso sejam extintas. Queremos orientar e informar a população para que se tornem agentes multiplicadores em defesa dessas espécies importantes e ameaçadas. Todos precisam entender que podemos viver juntos e em segurança”, conta Elaine Moura, educadora ambiental do Legado das Águas que vai liderar as atividades.
O Plano contempla a criação de uma campanha de conscientização em Juquiá, com ações como palestras para alunos dos ensinos infantil, fundamental e médio; encontros com comunidade e visita às áreas com registro do animal para esclarecimentos; além de encontros com o poder público e formadores de opinião para estimular a discussão sobre o tema.
Curiosidades
Considerada rainha das florestas brasileiras, a onça-parda está entre os principais símbolos de campanhas pela preservação da biodiversidade. A extinção do felino, que faz parte do topo da cadeia alimentar da Mata Atlântica, poderá causar um grande desequilíbrio ambiental.
Símbolo da fauna brasileira, a onça-pintada, é um mamífero que pode atingir até 2,41 metros e pesar 158 quilos, está ameaçada de desaparecer da Mata Atlântica devido à caça predatória e a perda e degradação de seu habitat. A gestação varia de 90 a 112 dias, podendo nascer até quatro filhotes, mas a média é de dois filhotes por gestação.
Ambas possuem papel importante na cadeia alimentar, pois controlam espécies que estão abaixo dela, que também podem causar transtornos se a população crescer muito.