Mais fábricas podem parar e carros vão ficar mais caros, alertam especialistas

Falta de peças e problemas de logística são os principais problemas das montadoras

Fábricas podem parar e carros vão ficar mais caros

Foto: Divulgação

A paralisação das fábricas da Chevrolet e da Honda ligou um sinal de alerta para a situação da indústria automobilística no Brasil. A medida tomada pelas montadoras é uma decisão drástica, condizente com os problemas que as marcas têm enfrentado nos últimos meses.

Cássio Pagliarini, associado da Bright Consulting – consultoria especializada no setor automotivo, revela que a grande maioria dos fabricantes, apesar de já terem diagnosticado quais são os problemas que afetam sua linha de montagem, estão de mãos atadas nesta situação.

“O que acontece é que a falta de chips eletrônicos paralisa a produção das fábricas, e a questão nem é que a fabricação de componentes está escassa, ela está mais disputada com outros segmentos tecnológicos”, revela Pagliarini.

Por conta da pandemia, a procura por notebooks, tablets e smartphones cresceu juntamente com o elevado número de pessoas migrando para o home-office. E como resposta, a indústria desses produtos elevou a requisição de mais matéria-prima. Logo, os fabricantes de chips, em sua maioria exportados pela China, viram-se obrigados a desviar parte da produção para suprir essa demanda.

No início deste processo, a indústria automobilística, principalmente no Brasil, não sentiu grandes impactos pela natural baixa de procura por carros com a determinação de lockdown em alguns países e circulação de poucas pessoas nas ruas. No entanto, com a retomada gradativa das atividades no segundo semestre de 2020, a busca por veículos voltou a se aquecer, devido à vontade da população de evitar o transporte público, acelerando a falta de matéria-prima.

Outra variante que pode ter agravado este problema de suprimentos para a produção dos carros no país, segundo Pagliarini, foi que “o Brasil pode ter ficado atrás na lista de prioridades dos fabricantes de componentes eletrônicos chineses” tanto pelo volume de peças, quanto pela distância do deslocamento. Assim, os fabricantes têm que se “virar nos trinta” para encontrar soluções nessa situação, exigindo muito dos seus times de logística para se entender com os fornecedores.

Apesar do cenário preocupante da indústria automobilística, Cássio enxerga que “em cerca de 90 dias” a situação pode ser melhorada com a chegada de mais componentes eletrônicos e estabilização dos estoques. No entanto, isso não significa que outras montadoras não possam seguir o caminho de Chevrolet e Honda e precisem parar suas linhas de montagem temporariamente.

Em evento promovido pela Automotive Business, Ivan Witt – diretor de compras, TI e de recursos humanos do Grupo Caoa – e Martin Fries – vice-presidente de compras da Volkswagen do Brasil – contaram como suas empresas estão reagindo ao atual cenário do setor.

Nas palavras de Witt, sua equipe de logística vem atuando em contato direto com fornecedores para evitar falta de material e revela que os componentes eletrônicos realmente são o ponto mais preocupante da linha de produção da Caoa. Já Fries diz que seu departamento vem se desdobrando para manter a produção, porém, caso haja um crescimento de problemas de logística, a montadora alemã não descarta uma paralisação de fábricas.

Outras questões inseridas nos trâmites entre as montadoras e os fornecedores de componentes eletrônicos, como o aumento do frete inserido na importação dos chips eletrônicos e a alta do dólar, também têm prejudicado os fabricantes brasileiros.

Ainda sobre o momento vivenciado pela indústria automotiva, Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores, deu seu parecer, baseado em três pilares, sobre o atual momento do setor, em coletiva à imprensa na última sexta-feira (05).

Segundo Moares, a junção de crise conjuntural – problemas com a compra e transporte de suprimentos, situação estrutural – condições tributárias impostas sobre a indústria automobilística – e a crise sanitária que ainda é vivenciada tiveram como consequência o momento ruim dos fabricantes de carros.

“A visão de mercado hoje é como a de uma pessoa que está em uma neblina, há muitas incertezas sobre o futuro. No entanto, o que se pode garantir é que todas as montadoras e suas equipes de logística, compras e RH estão se desdobrando e fazendo um trabalho árduo para diminuir os danos dessa crise”, comentou o executivo.

Milad Neto, associado da Jato Dynamics – empresa especializada em análise de mercado e consultoria do setor automotivo – relembra mais um ponto para se observar e tentar entender como se chegou a esse momento de crise da indústria e o movimento da economia chinesa em momentos de recessão.

Como já foi citado anteriormente, a maioria dos fornecedores de chips semicondutores são chineses, logo, a forma como as empresas do país asiático atuam interfere diretamente na produção das indústrias, não só de carro, mas de diversos segmentos no mundo todo.

“Em momentos de crise, como a pandemia, a China dá prioridade exclusiva para reestruturar a indústria local, e só depois volta abastecer os outros mercados. Somente nos últimos meses ela tem retomado as negociações e alimentou uma expectativa de melhora do fornecimento de matéria-prima”, detalha Neto.

Apesar dos fabricantes possuírem diferentes fornecedores de peças, ainda sim essa segmentação não é suficiente para dar vazão à linha de montagem. Isso mostra que, nas palavras de Milad, “a indústria pode chegar a uma situação em que não tem mais o que fazer. Quando você tem falta de materiais, mesmo atuando com estoque praticamente zerado, por vezes a única opção que resta é parar a fábrica”.

E no final das contas, quem arca com esse desequilíbrio é o consumidor final. Com a oferta de carros sendo diminuída, as montadoras tentam salvar suas contas aumentando o preço dos carros, enquanto promoções e condições especiais somem das concessionárias.

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