Até meados do século 19, a agricultura era uma atividade cuja principal função era prover as pessoas de alimentos e fibras. A preocupação central era garantir a segurança alimentar das pessoas que estavam, na maioria dos casos, muito próximas das áreas de produção. Atualmente, a agricultura é multifuncional, seus produtos são utilizados também, para a produção de energia, cosméticos, medicamentos, móveis, tintas, água e para o turismo. Na nova agricultura, que vem ganhando a cada dia mais importância, a questão da sustentabilidade passa a ter destaque, especialmente a ambiental, além é claro, da segurança alimentar e a produção de alimentos seguros.
O conceito de sustentabilidade ESG, sigla em inglês que significa econômico, social e governança, passa a ser incorporado nas empresas pois está sendo considerado por consumidores e investidores. Organismos internacionais como a FAO – órgão das nações unidas para agricultura e alimentação e a OMC – Organização Mundial do Comércio, elegeram a década de 2020 como a década de ações para a sustentabilidade.
Eventos internacionais para discutir os temas acima, estão previstos para ocorrerem durante o ano de 2021. O primeiro deles, promovido pela Organização das Nações Unidades – ONU, é a cúpula dos sistemas alimentares, quando serão discutidos temas relativos à agricultura, nutrição, meio ambiente e saúde. Pelos temas a serem discutidos no evento promovido pela ONU, não fica qualquer dúvida que a agricultura passa a ter uma nova dimensão, além da produção de alimentos, fibras e energia. Para se ter uma ideia prática da importância da sustentabilidade, a China passa a considerar a questão da sustentabilidade com estratégica, exigindo de seus produtores e dos países dos quais importa, principalmente alimentos, critérios de sustentabilidade. Também será realizado neste ano de 2021 na China, a convenção da diversidade biológica.
Nesse evento, a partir de objetivos definidos através do Protocolo de Nagoya sobre Acesso a Recursos Genéticos e Repartição de Benefícios decorrentes da sua utilização (em inglês, ABS, Access and Benefit-Sharing) da Convenção sobre Diversidade Biológica Justa e Equitativa, quando ficou acertada a repartição justa e equitativa entre seus membros dos benefícios decorrentes dos recursos genéticos provenientes das plantas, animais e micro-organismos.
Em outras palavras, buscou-se uma justa partilha das rendas auferidas através da exploração de processos e produtos comerciais derivados de recursos genéticos. Cabe aqui lembrar que a soja é originária da China, a cana-de-açúcar da Indonésia, o café da Etiópia, os bovinos zebuínos são originários da Índia. Com esses exemplos fica claro o quanto a convenção da biodiversidade biológica é um tema sensível. Outro tema da maior importância a ser discutido durante o ano de 2021 na conferência do clima, a ser realizada entre os dias 1º e 12 de novembro, na Escócia, fatores que contribuem para a emissão de gases de efeito estufa estarão no topo das discussões. O Brasil tem avançado de forma significativa nessa área, destacando-se a integração lavoura-pecuária-floresta – ILPF (https://bit.ly/2UmhWe0), o sistema plantio direto (https://bit.ly/3xYVxlN), carne carbono neutro (https://bit.ly/3qlnsJP) e a soja baixo carbono (https://bit.ly/2UufceO).
O plano Agricultura de Baixo Carbono, que preconiza adoção de tecnologias como o sistema plantio direto, a ILPF, a fixação biológica de nitrogênio, dentre outras tecnologias que contribuem para mitigar a emissão de gases de efeito estufa, é um dos componentes da política pública para descarbonizar a agricultura brasileira. Iniciativas importantes estão sendo implementadas pelos produtores de algodão que através do selo de Algodão Brasileiro Responsável – ABR, tem como fundamentos promover a evolução progressiva das boas práticas sociais, ambientais e econômicas a fim de construir uma boa imagem do algodão brasileiro e conquistar espaço no crescente mercado do algodão responsável. No que se refere às práticas ambientais, os produtores são estimulados proteger nascentes, cursos e reservas de água;
preservar os biomas e o solo;
manter a qualidade do ar, da água e do solo. No caso do algodão a iniciativa é liderada pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão – ABRAPA (https://bit.ly/3h02lbB). Outro exemplo é o Programa Soja Plus, que prevê a melhoria contínua das propriedades rurais, que tornou-se referência em âmbito nacional e internacional e é reconhecido como o mais eficiente programa de gestão de propriedade e gerenciador de riscos socioambientais (https://bit.ly/3vROSIi). Esse programa é executado pela Aprosoja-MT.
Diversos são os exemplos de iniciativas onde o foco é a sustentabilidade da atividade agropecuária. Pelos exemplos acima, verifica-se que o Brasil está muito bem sintonizado com os temas atuais da moderna agricultura. No entanto, ainda temos muito onde melhorar, especialmente no que se refere a adoção das tecnologias já disponíveis, o que em muito impactará positivamente na forma de se produzir alimentos, fibras e energia. Em outros temas como a diversidade biológica, aspectos de nutrição e saúde a partir da agricultura, ainda temos um espaço para que possamos avançar. O mesmo pode ser dito em relação ao uso de insumos químicos tais como fertilizantes e agentes de controle de plantas daninhas, pragas, doenças, nematoides e ácaros que podem causar danos econômicos aos principais cultivos agrícolas. Faz-se necessários esforços articulados para minimizar o uso de tais produtos na agricultura.
Otimizar o uso da água na agricultura também constitui um tema a ser mais estudado. Aumentar a produtividade, minimizar os riscos, otimizar o uso dos recursos naturais, especialmente solo e água, sem perder de vista os grandes temas ligados a produção de alimentos, fibras e energia que a cada dia ganham mais espaço nos fóruns internacionais, onde o tema agricultura é discutido, deve ser a prioridade de todos os envolvidos com a produção agrícola, pois estes apresentam demanda crescente.
*Fernando Mendes Lamas
Pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS