A vitimização de policiais militares no estado do Rio de Janeiro já tem índices alarmantes. Para a pesquisadora da FGV DAPP, Carolina Taboada, a crise financeira não é a única culpada pelo alto índice de PMs mortos. Segundo ela, a presença constante de membros do governo estadual em escândalos de corrupção gera uma percepção de abandono e desgoverno que é percebida pela população em geral e pelas facções do crime organizado, que estão aproveitando este momento para se reorganizar no território.
“A crise pela qual o projeto das UPPs passa também contribui para esse número na medida em que estamos vendo, neste ano, o retorno dos tiroteios e confrontos em regiões nas quais antes eles estavam controlados – ainda que o tráfico de drogas nunca tenha realmente deixado por completo as comunidades nas quais as UPPs foram instaladas. Aliado a isso, que reflete mais na situação da capital – onde se concentra a maior parte das UPPs –, é possível observar um grande espalhamento da mancha criminal para as outras áreas do estado, o que é uma dinâmica nova para o Rio de Janeiro: há poucos anos, a capital concentrava a maior parte dos crimes do estado, o que permitia uma atuação mais concentrada das forças policiais”, aponta Carolina Taboada.
A pesquisadora da FGV DAPP alerta que o crescimento dessa mancha é um desafio para a política de segurança pública, tanto para garantir a segurança da população quanto dos seus próprios agentes, que morrem muitas vezes fazendo “bicos”. Taboada ressalta que existe o fato de policiais correrem mais risco quando estão na rua pela possibilidade de serem reconhecidos como tal.
“Policiais tendem a reagir mais a assaltos, o que frequentemente gera desdobramentos violentos, tanto por andarem armados quanto pelo medo de serem reconhecidos quando estão trabalhando fora do seu horário de serviço para complementar a renda. Nesse sentido, a crise fiscal do estado pode estar diretamente ligada ao aumento das mortes, já que o atraso dos salários e o fim das bonificações do Sistema Integrado de Metas geraram uma perda/instabilidade na renda dos policiais militares”, observa a especialista em segurança pública.
Para reverter essa realidade, Carolina Taboada sugere uma combinação de ações que inclua o enfrentamento inteligente ao tráfico de armas e o controle de armas legais em circulação, de forma a diminuir a violência letal como um todo, o que afetaria diretamente a violência com morte direcionada a agentes da segurança pública.
“Além disso, o estado precisa controlar de maneira firme o bico ilegal – o retorno do RAS (Regime Adicional de Serviço) e do PROEIS (Programa Estadual de Integração na Segurança), que permitia que os policiais militares pudessem trabalhar de forma voluntária em suas folgas mediante gratificação, seriam boas medidas nesse sentido, dando ao policial a possibilidade de gerar uma renda extra com um maior controle por parte do estado do que ele está fazendo”, propõe a pesquisadora da FGV DAPP.
Vitimização em serviço – Já em agosto, o número de policiais mortos em serviço ultrapassou o total do ano de 2004, quando 50 foram mortos, maior índice desde que 1994. Taboada lembra, o que vemos hoje como principal modo de atuação da polícia são ações pontuais, que frequentemente incluem enfrentamentos diretos que envolvem tiroteios, alta possibilidade de baixas e, na maior parte das vezes, pouco retorno em termos de resultados.
“Ações de inteligência que foquem na entrada de armas e drogas no estado e na prisão de grandes traficantes, em vez das pequenas apreensões e prisões de pessoas transportando reduzidas quantidades ao consumidor final, teriam maior impacto na segurança da cidade com menos perda de vidas. Para isso é também fundamental a atuação de maneira mais presente do governo federal, e não apenas com o envio de forças militares”, adverte a pesquisadora.
Carolina Taboada recomenda que o governo federal precisa atuar para coordenar os estados na investigação e repressão a crimes que atravessam fronteiras estaduais e frequentemente nacionais, como a circulação de armas e drogas. “O aumento das ações de inteligência passa, portanto, pelo governo federal assumindo um maior protagonismo na segurança pública e reconhecendo a natureza transfronteiriça que está na raiz da violência no Brasil”, aponta.