O pai acompanha o filho até o ponto do ônibus e espera, pacientemente. Após mais de uma hora, ficam sabendo que o veículo da Viação ABC foi recolhido à garagem. Só no dia seguinte conseguiram ver o Caio Millennium passar, exemplar único estreando na região. Isso mesmo, viram o ônibus passar, e não embarcaram.
“Fiz muito isso no passado, o que limita hoje é a falta de tempo”, lembra Adamo Bazani, 36 anos, jornalista de profissão e busólogo por paixão. Busólogo?! Se a palavra é novidade para você, saiba que eles são pessoas aficionadas por ônibus, que se dedicam ao passatempo de estudar esses veículos e temas afins, colecionando miniaturas, fotos, ou qualquer outra coisa que tenha relação com os grandalhões do transporte coletivo. E, sim, ao contrário da maioria da população, eles adoram se deslocar de ônibus, gostam do barulho de seus motores e, se pudessem, passariam horas dentro das garagens que fazem sua manutenção observando o trabalho.
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Não se sabe ao certo quantos busólogos há no Brasil, mas basta uma busca na internet para ver que o hobby é mais comum do que se imagina. Bazani é apenas um dos representantes do movimento. Natural de Santo André, município do ABC paulista, ele conta que a paixão começou na infância, por influência do pai, que é metalúrgico. “Aos quatro anos pegava sozinho um ônibus da viação Padroeira do Brasil e ia até o ponto final, no bairro do Paraíso. Fazia isso várias vezes ao dia e meu pai me incentivava, pois percebeu que eu gostava demais”, lembra.
Os tempos eram outros: os motoristas e cobradores da linha eram amigos da família e cuidavam do menino. Nessa época também ganhou do pai a primeira miniatura de ônibus, hoje em destaque em sua coleção de 260 peças, de diversos modelos e tamanhos, que cuida como um tesouro pessoal.
O tempo só fez o interesse pelos ônibus aumentar e, em certo momento, Bazani conseguiu unir hobby e profissão. “Sofri um acidente de carro em 2009 e fiquei três anos afastado do trabalho, na rádio CBN. Voltei fazendo matérias para a seção ‘São Paulo Conta sua História’, entrevistando motoristas e cobradores.” A repercussão foi excelente: “As pessoas se identificavam muito com os relatos, histórias do desenvolvimento da cidade em cada personagem”.
Hoje ele faz também a cobertura de transporte coletivo da cidade, o que lhe permite conhecer as montadoras e suas novidades, além das garagens. “Já passei muitas madrugadas nesses galpões. O que acontece dentro das garagens é um processo quase industrial, é necessário muito trabalho para que um ônibus volte a operar logo nas primeiras horas da madrugada”, diz Bazani, que mantém um blog especializado chamado Ponto de Ônibus. “Esses veículos são parte do desenvolvimento econômico das cidades e isso, mais a possibilidade de discutir mobilidade urbana, são os aspectos que mais valorizo no hobby”, diz o jornalista.
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Bazani e outros especialistas mencionam Helio Luiz de Oliveira como a primeira pessoa a receber o título de busólogo no Brasil. “Em 1986, eu trabalhava como projetista na extinta Thamco, na época a única encarroçadora no estado de São Paulo. Sabendo do meu interesse pelo tema, meus amigos e colegas de trabalho Orcars Pipers e Jean Dierckx passaram a me chamar de Helio Busólogo, e o apelido pegou”, lembra. Mais do que isso, o termo passou a definir todos os especialistas e fanáticos por ônibus do Brasil. Sua paixão o levou até a mudar de profissão, mas sem abandonar a paixão: desde 2003, Oliveira edita a revista In Bus, uma das únicas dedicadas aos ônibus, além de vários blogs especializados.
O pioneiro da busologia conta que a obsessão pelo assunto também começou cedo. Em 1979, ainda na faculdade, fundou com alguns amigos o Clube do Design de Ônibus (CDO), considerado o primeiro do tipo no País. “Passávamos os dias escrevendo cartas para as 276 indústrias de ônibus existentes no mundo pedindo seus catálogos impressos com informações. Minha carteira não tinha dinheiro, só selos”, brinca. Muitos anos depois, ganhou de Quirino Grassi, um dos donos da empresa pioneira de carrocerias para ônibus Grassi, um acervo que deixaria qualquer busólogo maluco: cerca de 5 mil cromos com imagens de ônibus do mundo todo. “Ele sabia do meu amor pelos ônibus quando me deu esse presente, que guardarei para sempre”, diz.
Ponto de partida
O bairro da Lapa, zona oeste da capital paulista, abriga um ponto de ônibus que é considerado único sobrevivente desse tipo de abrigo da década de 1960. Construído pela extinta Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC), ele é amplo, feito de ferro e fixado na calçada com concreto. Localizado na praça Coronel Cipriano de Morais, foi adotado pela comunidade e até ganhou de artistas locais uma intervenção no teto com colagens e pinturas.
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